Claro que quando há um investimento desmesurado em rodovia e se negligencia a ferrovia, isso traz consequências.
Na UE-27, a repartição do transporte de passageiros pelos dois modos é, em média, 92,1% para a rodovia (82,8% de carros pessoais e 9,3% de autocarros) e 7,9% para a ferrovia. Em Portugal há apenas 5,5% de utilização de ferrovia.
Ao analisarmos o transporte de cargas, a realidade nacional é ainda mais diversa da realidade europeia. Enquanto na Europa se transporta 17,6% das cargas por ferrovia, 5,9% através de transporte fluvial e 76,5% de rodovia; em Portugal transporta-se 5,3% das cargas por ferrovia e 94,7% por rodovia, não havendo transporte fluvial. Não trouxesse isto problemas graves e não seria sequer assunto, mas esta predominância do transporte rodoviário é algo de muito grave, principalmente devido às questões ambientais, mas não só.
Fonte: Eurostat Yearbook, 2008
Nota: os dados são de 2004 para os passageiros e 2005 para as cargas.
Eu até sou algo sensível a alguns argumentos do Carlos. Sou liberal, mas não sou autista e tenho noção que é necessária alguma intervenção em algumas situações, que as outras alternativas, por vezes, não são melhores. O que contesto aqui é, por um lado, a dimensão do investimento e, por outro, o período em que é feito. E até um pouco a própria lógica do investimento.
Vamos por partes. Temos imensos problemas com as actuais infra-estruturas sociais e todos o sabemos. As actuais estruturas de apoio social não resultam e a realidade é a prova disso. Não seria, por isso, mais interessante investir nas já existentes de modo a melhorá-las e a torná-las um tipo de serviço público de «excepção», ou seja, para os mais necessitados por mera lógica de mal menor? O Cameron tem uma frase muito interessante sobre isto, que cito de memória: dar mais a menos. Ou seja, não abranger o país inteiro nos programas sociais porque a realidade é que nem todo o país o necessita. Vamos ser pragmáticos e deixarmo-nos do discurso politicamente correcto que ainda não estamos em campanha: hoje em dia, uma família de classe média consegue pagar a creche dos filhos. E, e isto é mera especulação, penso que os preços seriam muito mais baixos se não houvesse tanta intervenção - ao haver tantos serviços sociais, os serviços privados funcionam com as «sobras» e é sempre complicado prever o futuro próximo porque, vai na volta, um primeiro-ministro decide criar em seis meses 400 lares e creches: não há concorrência que suporte isto.
Mas nem é este o centro da discordância. Estas questões são, quanto a mim, importantes, mas se calhar os socialistas não lhes dão importância. Do que discordo é do prazo e da dimensão. Se a proposta fosse, imaginemos, criar 400 lares num prazo de cinco anos, por exemplo, seria uma pouco mais aceitável. No entanto, num escasso período de seis meses, em época de crise, quer-se aumentar a máquina do Estado, contratando mais 10 000 pessoas e investindo imenso dinheiro, investimento esse que não é propriamente potenciador de mais investimento é uma loucura. Dizes que em época de crise é preferível criar empregos públicos a pagar subsídios. Respondo-te com um redondo não. É que dar o subsídio de desemprego é algo de temporário - suponho que daqui a dois anos a situação estará normalizada - enquanto criar novos empregos públicos implica que estes se mantenham como um custo para a população «para sempre». Não se pode aumentar a máquina conforme são as conveniências de cada momento
Quanto aos benefícios indirectos, enuncia-los muito bem, volto a repetir que tenho algumas desconfianças quanto à intervenção excessiva neste mercado, mas que isso tudo acontece, é certo. E é óptimo que aconteça. Mas não é isso que está em questão aqui. O que está em questão aqui é que temos um governo a fazer uma política de contra-ciclo sem qualquer tipo de reflexão aprofundada, apenas com programas de investimento que irão onerar gerações e gerações por vir.
Finalmente, é interessante analisar muito bem os números do TGV.
Segundo o Panorama of Transport, relatório do Eurostat publicado em 2009, está projectada a construção, para Portugal, de um total de 519 quilómetros de linha de alta velocidade. A linha entre Lisboa e a fronteira com Espanha, com 207 quilómetros, tem início programado para 2013, ano em que acaba o actual QREN, e a linha entre Lisboa e o Porto, com 312 quilómetros, tem início programado para 2015.
Estes números sozinhos não nos dizem nada, pelo que é interessante compará-los com a restante Europa.
Na União Europeia, até 2007, apenas havia seis países com linhas de alta velocidade, a saber: França, Alemanha, Reino Unido, Bélgica, Espanha e Itália. Destes, os mais ricos da União, temos a Itália com 562 quilómetros de linha, a Bélgica com 120 quilómetros e o Reino Unido com 113 quilómetros. Destes três, a Itália tem programada a construção de mais 328 quilómetros a partir de 2008/2009 e a Bélgica tem programada a construção de mais 77 quilómetros. Estes são países que já iniciaram a entrada na RAVE há cerca de 10 anos, tirando o Reino Unido, e à excepção da França, nenhum iniciou a construção com uma dimensão tão significativa como a nossa. Para fazer algum paralelo com o nosso país, a Holanda, muito mais rica, vai começar este ano a entrada na RAVE e apenas tem projectados 120 quilómetros de rede.
Isto não é discurso do bota-abaixo, é apenas a revelação de alguns números que fazem cair por terra aquelas declarações catastróficas e quase alarmistas de que não podemos ficar para trás neste processo, que não podemos ficar isolados da Europa. Volto a repetir: em vinte e sete, apenas seis estão na RAVE e este ano entra mais um. Portugal será o oitavo e, depois de concluídas as linhas, se tudo correr conforme ao programa, seremos o quinto país com a maior rede. Temos uma economia tão poderosa assim?
É interessante olhar para alguns dados estatísticos que fundamentam a tese do post anterior.
Segundo o Eurostat, Portugal tem 3% do total de quilómetros de estradas da Europa dos 27, o que, atendendo à dimensão do país, é um número assombroso. Para cada 100.000 habitantes, há 22 quilómetros de estradas, o que nos dá um confortável 5º lugar neste indicador. Se atendermos à dimensão geográfica, constatamos que Portugal tem 25 quilómetros de estradas por cada 1000 quilómetros quadrados, indicador no qual estamos em 7º lugar.
Já em relação à rede ferroviária, os números não são tão simpáticos assim. Na Europa dos 27 somos o segundo país com menos quilómetros de linhas férreas por cada 100.000 habitantes, tendo 27 enquanto a média é 45 . Do mesmo modo, em 1000 quilómetros quadrados, temos apenas 31 quilómetros de linhas férreas, quando a média europeia é 51 - somos o 8º pior. De toda a rede ferroviária, apenas 50% está electrificada, um valor dentro da média da união, mas atendendo à tão reduzida dimensão da rede e às tão grandes preocupações com a dependência energética, parece-me que o valor é francamente baixo.
Se é vontade dos partidos e dos economistas que se faça investimento público, pois muito bem, mas ao menos façam-no onde é preciso e não cubram o país de alcatrão desnecessário.
Fonte: Panorama of Transport, 2009
Nota: todos os dados apresentados no post são de 2005.
Discordo de muita coisa, no entanto, é interessante ler os artigos do Pedro Lains sobre a questão dos grandes investimentos.
Penso que o autor cai no erro de olhar para a questão do investimento de uma forma imediatista. É verdade que segundo o quadro de que fala, Portugal cresceu devido aos investimentos na Expo 98 e no Euro 2004, no entanto, retiro conclusões diferentes da análise. Enquanto o Pedro vê um crescimento, logo uma coisa boa, eu vejo que houve um crescimento que não foi sustentado nos anos seguintes. Será este o objectivo? Não creio.
Por outro lado, diz a determinada altura que a percentagem do PIB gasta em investimento deve rondar os 25%. Se observarmos o quadro, constatamos que rondamos os 23%. Posto isto pergunto, simplesmente, porque é que legitima as Obras Públicas com a «falta de investimento»?
O que propõe é que o valor do investimento público duplique e se mantenha nesse volume durante cinco anos. Não será de esperar que a economia fique demasiado dependente da injecção e que, no fim dos cinco anos, acabe por se ressentir muito mais? Ambos sabemos que as diferentes injecções feitas não têm sido aproveitadas para uma verdadeira modernização - veja-se, a título de exemplo, o caso dos subsídios à agricultura.
É óbvio que o TGV tem de ser feito algum dia. É óbvio que o aeroporto tem de ser feito algum dia. A questão é a pertinência de cada um neste momento. Sendo obras de modernização, importantes é certo, tenho dúvidas se serão as mais prioritárias neste momento. Sem querer entrar em partidarismos e coisas que tais, uma proposta alternativa é que em vez de se gastar tão avultadas quantias no TGV, neste momento, se investisse na rede ferroviária que está, para grande prejuízo da economia nacional e das diferentes regiões, demasiado negligenciada. Parece-me que seria muito mais interessante a recuperação da rede base do que a criação de uma rede topo de gama completamente desfasada do que a envolve.
Para além disso, refere-se no texto apenas ao investimento no TGV e no aeroporto, no entanto, existe uma enorme quantia de dinheiro destinada a construir mais auto-estradas. Neste momento somos dos países com mais auto-estradas da Europa e toda esta construção não trouxe resultados propriamente espectaculares. Não será absurdo manter o mesmo rumo?
Esqueçamos que estamos em crise. Esqueçamos simplesmente os condicionalismos actuais e prendamo-nos apenas com a discussão abstracta deste assunto. Bem sei que muitos me dirão que não o posso fazer. Que se danem, que no meu blogue faço o que me apetecer.
A primeira pergunta, retórica, que a resposta sei-a eu, é: como se define um preço? Haverá algo neste mundo cujo valor monetário seja intrínseco? Há algum bem que em qualquer parte do mundo, em qualquer momento da História, tenha tido o mesmo valor? Não. E a razão é muito simples. Por muito que se faça por esquecer este pequeno detalhe, o preço do que quer que seja é estabelecido pelos mecanismos de oferta e de procura. Vale aquilo que o comprador estiver disposto a pagar, conjugando essa disposição com a do vendedor. Quanto queres, quanto dou. Nada mais básico, nada mais fundamental. É isto o preço.
Descoberto que está como se estabelece o preço do que quer se seja, que outra forma não existe que seja tão fiável, como é que se pode aceitar que o Estado fixe preços mínimos, como o preço mínimo pago pelo trabalho, mais comummente conhecido por “Salário Mínimo Nacional”?
(Clicar para ver maior)
O Pedro Sales escreve que a direita portuguesa anda à nora à conta disto que está aqui em cima. São os resultados de uma sondagem feita pela Visão que dão conta que a maioria das pessoas confia mais na gestão pública que na gestão privada. A concordância do Pedro é tal que ele nem escreve mais nada, apenas apresenta a "evidência".
O problema deste tipo de sondagem é que é absurda na sua essência. O problema da gestão pública/gestão privada é um problema de Economia, aquela ciência que se ensina nas faculdades e que não é pêra doce. Fazer recolhas de opinião sobre Economia é o mesmo que as fazer sobre a Teoria da Relatividade. Então, caro transeunte, que lhe parece do amigo Einstein e das suas descobertas? A Economia, por muito que se queira, não é uma ciência democrática: não está certo o que a maioria diz estar certo em economia. Esse é um dos grandes motivos que me faz pensar que o Estado não deve interferir, da mesma forma que não interfere nas outras ciências. Imagine-se que havia um ministro da ciência que dizia que a gravidade não existia.
Para além disso o Pedro parece esquecer-se que em Portugal já vivemos durante alguns anos com uma economia quase toda estatal: todos os sectores verdadeiramente importantes pertenciam ao Estado. O resultado foi o que se viu. Mas até se poderia advogar que isto foi com Portugal e que houve problemas domésticos que levaram à situação. Então é ir aos manuais de História ver o que aconteceu com a China entre 1949 e 1980, ou a situação a que chegou a URSS em 1989. Até poderia ser tudo uma coincidência, afinal, podem ter ocorrido precalços em toda a parte. É perfeitamente plausível, não é?
Tal como escrevi no último post, nos primódios do socialismo havia desigualdades sociais quase que impostas pelos próprios Estados: a aristocracia era detentora da riqueza e ao povo cabia trabalhar e, se assim entendesse, tentar sobreviver. Dado que apenas a aristocracia e alguma burguesia tinha dinheiro para investir verdadeiramente, as oportunidades estavam condicionadas à partida: nem todos estavam no mesmo patamar. Isto levou, realmente, a uma subvalorização quase dramática dos trabalhores e a uma sobrevalorização dos empresários (capitalistas, como o pessoal gosta de lhes chamar - como se fosse ofensivo). Mas isto aconteceu exactamente, e curiosamente, por causa da intervenção do Estado na fase anterior: apenas alguns tinham riqueza, apenas alguns tinham estudos, a maior parte não tinha nada. As políticas sociais, à data, foram apenas a forma como os Estados tentaram resolver o problema. Se não ganham naturalmente, pois que ganhem por decreto. Surgiram os Welfare Sistems (finais do século XIX na Europa e princípios do século XX na América).
O problema é que, à altura, uma política de redistribuição do rendimento que beneficiasse pobres era apenas o remediar do erro de uma política de redistribuição que beneficiava ricos. Cometeu-se um erro para tentar tapar outro. A coisa funcionou, basicamente, num esquema Robin Hood. Fez sentido à data.
No entanto, e apesar de ter feito sentido na altura fazer-se algo do género, actualmente isto é completamente distituído de significado. Actualmente, e apesar de as oportunidades continuarem a não ser as mesmas à partida, o problema não é sequer semelhante ao de antes e, ainda assim, as políticas sociais de agora são muito mais "pesadas" que na altura.
Actualmente temos aquilo que é mais desejável para uma economia: uma classe média. Temos uma grande parte da população neste limbo entre ricos e pobres e toda a economia, se deixada a funcionar, levará a que haja uma convergência para este centro: os pobres, pelo trabalho (e não a ser sustentados por dinheiro roubado aos outros) tornar-se-ão mais abastados e os ricos, a certa altura acabarão por perder o dinheiro que possuem por algum episódio de incompetência (esta crise é disso demonstrativa).
O Estado, ao precipitar tudo através das políticas sociais faz com que pareça não haver problema quando o sistema está todo podre: mete a carpete em cima do buraco. Se um pobre se tornar abastado com o dinheiro dos impostos alheios, certamente contribuirá para que haja menos desigualdade na repartição do rendimento. No entanto, sabemos que essa "contribuição" não foi pela via normal, não foi pelo trabalho: tirou-se de outros para lhe dar a ele em vez de ele produzir para enriquecer sem ser às custas dos outros. O sistema é semelhante ao que agora se faz com os certificados de habilitações: as pessoas têm a quarta classe, dá-se-lhes um diploma do 9º ano, ou seja, faz-se estatística sem que a pessoa tenha realmente as competências de um 9º ano. A única diferença, para que eu seja rigoroso, é que no primeiro caso a pessoa fica com dinheiro e no segundo caso as competências mantêm-se, mas percebe-se a ideia.
Depois há o problema de fundo: ao promoverem políticas sociais, ou seja, formas de o país sustentar os pobres, o Estado desincentivará esses pobres a trabalhar. A situação acaba por se perpetuar e aqueles pobres, acomodados à situação, permanecerão empecilhos para os outros, empecilhos que os outros são obrigados a sustentar.
No último post mostrei que dois dos grandes obstáculos à criação de empresas em Portugal são criados pelo próprio Estado: protecção do emprego e burocracias no processo.
Quais são, então, as consequências práticas disto?
Com uma situação de trabalho protegido e obstáculos à criação de empresas, o que vai acontecer é que uma grande massa de população vai preferir o trabalho por conta de outrém, ao passo que apenas uma fina camada da população, a mais competente, com mais capital disponível, vai abrir uma empresa: apenas os loucos ou os ricos abrem uma empresa. A abertura de uma empresa fica mistificada e cria-se quase uma barreira psicológica: nem pensar nisso.
Teremos, portanto, uma grande quantidade de população a querer trabalhar por conta de outrém e muito pouca população a trabalhar por conta própria e à procura de trabalhadores. Como qualquer pessoa irá facilmente compreender, haverá uma sobrevalorização dos empresários e uma subvalorização dos trabalhadores. Regras do mercado, não há nada a fazer. Os trabalhadores, por serem tantos, perdem valor. Assim, os poucos empresários que há serão muito bem remunerados (os trabalhadores, que valem pouco, não se importarão que uma boa parte do rendimento do seu trabalho fique na posse do empregador) e os trabalhadores serão muito mal remunerados (por serem tantos a competir pelos mesmos empregos, terão de baixar o seu preço).
Criam-se desigualdades sociais. Chegando a esta situação (que nos séculos XIX / XX era grandemente causada por o capital pertencer a algumas elites - aristocracia) os governantes sentem necessidade de agir. E agem, regando o fogo com gasolina, mas isso fica para o próximo post.
Há algum tempo que estou em crer que a grande causa, apesar de parecer paradoxal, para o empobrecimento generalizado da população e enriquecimento de apenas uma pequena franja se deve à protecção do emprego, por um lado, e aos obstáculos à criação de empresas por outro. Passo a explicar. Quando um indivíduo chega à idade adulta, tem de optar entre trabalhar por conta de outrém ou trabalhar por conta própria. Obviamente, antes de fazer esta opção, vai considerar os prós e os contras de cada uma. A maioria dos jovem-adultos chegam à conclusão que é preferível trabalhar por conta de outrém numa fase inicial devido à falta de experiência. No entanto, quando a falta de experiência deixa de ser um problema, seria de acreditar que o profissional se fizesse à estrada e criasse o seu próprio negócio, em vez de apodrecer nos quadros de uma empresa alheia. Não acontece.
Na maioria dos casos, um indivíduo que entra, por exemplo, para os quadros de uma empresa permanece aí para o resto da sua vida activa, não tendo qualquer ambição de ter um negócio seu, onde certamente ganharia mais, pois não haveria nenhuma parte do rendimento do seu trabalho que fosse para os donos da empresa/accionistas. É interessante perguntar: porque é que isto acontece? Penso que a resposta é óbvia: não é vantajoso. Olhando para os prós e contras de um quadro de uma empresa abrir a sua própria empresa, veremos que os contras suplantam por completo os prós. Ora vejamos: um quadro de uma empresa tem o seu emprego seguro (a única coisa que o fará perder o emprego será ou a falência da empresa ou uma situação de extrema falta de competência), abrir uma empresa envolve um trabalho burocrático complicado e dispendioso, há o factor risco e ainda a necessidade de capital para investir. No lado dos prós, o único motivo que poderia levar um bom trabalhador a abrir uma empresa seria a possibilidade de auferir mais rendimento pois, por um lado, é o único beneficiário do seu trabalho (numa empresa, uma parte do nosso rendimento vai para o gerente) e, por outro lado, poderá ainda ganhar partes dos rendimentos dos seus empregados, que têm de dar alguma coisa em troca da segurança conferida pelo trabalho por conta de outrém.
Agora, olhemos para os contras a abrir uma empresa. Dos quatro factores enunciados, apenas dois decorrem naturalmente da abertura de um negócio: o risco e a necessidade de capital. Os outros dois: segurança no trabalho por conta de outrém e o trabalho burocrático são obstáculos criados pelo Estado, que podem ser comprovados aqui.
Para já, neste post, não vou avançar mais. No próximo explicarei as consequências disto.
Segundo a Heritage Foundation, Portugal é Moderately Free. Significa isto que, comparando os índices de liberdade económica do nosso país com os de outros países, a nossa classificação é baixa. Olhemos para os primeiros dez países do ranking:
Se clicar na imagem, vai constatar que estes são, por um lado os países com melhores resultados económicos no mundo e, por outro, os países de onde se diz virem os melhores índices de optimismo e satisfação. São sociedades livres, com todos os benefícios que isso pode trazer. E a liberdade destes países é transversal a várias áreas: é fácil criar uma empresa, o trabalho é flexível, há facilidade no investimento, há pouca corrupção, entre outros indicadores. Chamo especial atenção para a Dinamarca, cuja posição é fortemente afectada devido ao peso do Estado e, obviamente, à carga tributária, que tem os melhores índices no respeitante à liberdade na criação de um negócio e à flexibilidade no trabalho. Para dar um exemplo, na Dinamarca não existe ordenado mínimo instituído, no entanto, não é particularmente conhecido pelos problemas sociais.
Agora vejamos o relatório sobre Portugal:
Se clicarem na imagem, vão constatar que, ao contrário dos países do topo, temos uma grande falta de liberdade no que respeita às relações laborais. O Código do Trabalho extremamente rígido, a dificuldade em despedir e renovar quadros, as complicações negociais, os custos não salariais elevadíssimos (o patrão paga mais de segurança social que o empregado, mais do dobro) levam, tal como o relatório diz, a uma produtividade reduzida e a um obstáculo às oportunidades de emprego. Por outro lado, apesar de termos uma situação relativamente facilitada na criação de empresas, as licenças e procedimentos legais são obstáculos que permanecem.
Considero que esta falta de liberdade económica é a grande causa de muitos dos nossos problemas. Numa altura em que se apregoa por aí que o caminho é o da regulamentação, vou contra a corrente e vou expôr algumas ideias sobre as quais tenho pensado nos últimos tempos.
Inspirei-me para este texto aqui.
On Monday morning's Today Show, Ann Curry's interview with the former president — recorded over the weekend outside a Clinton Global Initiative event in Texas — addressed Clinton's inclusion on TIME's list of the "25 People to Blame" for the global economic collapse. "Oh no," he responded, "My question to them is: Do any of them seriously believe if I had been president, and my economic team had been in place the last eight years, that this would be happening today? I think they know the answer to that: No." (See TIME's list of the 25 people to blame for the collapse) (Time)
Então o ex-presidente Bill Clinton considera que não foi o responsável pelo actual colapso económico. O ex-presidente Bill Clinton considera que se estivesse na Casa Branca nos últimos oito anos, nada disto tinha acontecido. Vejamos então, de novo, este vídeo divulgado pelo Ordem Livre:
Lembrei-me a propósito desta notícia de um texto do Álvaro Santos Pereira sobre a natalidade e mortalidade das empresas. Na altura não identifiquei propriamente a causa da situação em que nos encontramos: somos o terceiro país da UE com menor taxa de natalidade de empresas e temos uma taxa de sobrevivência que ronda os 95%. Afinal, não é assim tão difícil de perceber.
No que ao trabalho diz respeito o indivíduo tem duas opções: ou trabalha para outro ou cria o seu emprego. Como sabemos, em Portugal, o trabalho por conta de outrém é extremamente protegido e vantajoso, ao passo que a criação de uma empresa envolve encargos avultadíssimos, para além do risco inerente à criação de uma empresa, ainda há todo um conjunto de obstáculos criados pelo próprio Estado aos "aventureiros" (burocracia, gastos com essa burocracia, impostos e responsabilidades sobre os trabalhadores).
Assim, ao pesar os prós e os contras de cada uma das vias, é óbvio que o comum mortal vai optar pela segurança do trabalho por conta de outrém e apenas quem está acima da média vai realmente avançar com algum tipo de negócio. Como apenas estas pessoas o fazem, é óbvio que as empresas vão ser bem sucedidas, mais não seja pela falta de concorrência.
Oponho-me terminantemente à intervenção do Estado na gestão das empresas privadas. A criação de empresas públicas já é condenável, mas interferir deste modo no funcionamento da economia é criminoso. É criminoso pelo simples facto de um grupo de pessoas (governo) estar a utilizar dinheiro que retira de forma autoritária à população para dar de mão beijada a um conjunto reduzido de pessoas (empresários). Por outro lado, é criminoso porque cria uma situação de falta de igualdade à partida. Se a empresa x é ajudada e a empresa y não, a empresa x vai ter maiores potencialidades de subsistência que a empresa y. A concorrência deixa de existir.
Qualquer discussão que parta do pressuposto que é admissível que o Estado "salve" empresas, seja sobre manutenção de empregos ou outra coisa qualquer, nem sequer deveria tomar lugar. Paulo Portas deveria ter estado calado.
Oiço por aqui e por ali discussões sobre o quinto canal. Se é preciso, se devia avançar ou não. E quando oiço isto apercebo-me do absurdo a que chegamos. Por que raio é que é preciso haver restrições à priori à entrada de mais um concorrente num mercado? Porque é que eu só posso criar um canal em sinal aberto se me derem vaga?
Temos quatro canais, sendo que apenas três se podem considerar como tal, porque o quarto (neste caso, o segundo) é um buraquinho para onde o Estado manda dinheiro sem fundamento nenhum. O mercado do audio-visual gera riqueza de uma forma absurda, é um El Dorado para os investidores e o Estado bloqueia a entrada. O que é que isto faz? Menos diversidade na oferta, menos concorrência (o que diminui a qualidade) e perpetua um desequilíbrio, porque se a criação de canais fosse livre, a existência de muitos já teria levado, há muito, a uma normalização e os donos das estações não seriam milionários.
Tive sérias dificuldades em escolher o título, isto porque costumo concordar imenso com o que o Pedro Arroja escreve no Portugal Contemporâneo. No entanto, um post por ele escrito sobre os benefícios do proteccionismo numa situação de crise como a que vivemos obriga-me a responder-lhe. Como a resposta é grande, não pode ser feita em comentário.
Vou pegar exactamente no mesmo cenário que Pedro Arroja avançou: imaginemos que dez milhões de chineses vinham para Portugal neste momento. Esses chineses substituiriam os portugueses em todas as suas funções, dado que fazem tudo aquilo que os portugueses podem fazer, mas a metade do preço. Segundo PA, o único benefício que isto traria era os preços todos pela metade, pois dez milhões de portugueses ficariam sem emprego. Por isto, PA diz que a melhor solução para uma crise como a que atravessamos é o proteccionismo.
Com todo o respeito, não poderia estar mais errado. Vamos partir de uma premissa base: todas as pessoas têm necessidades. Vamos a outra premissa simples e que certamente não constitui novidade para o economista Pedro Arroja: as necessidades são o motor da produção - para que as primeiras sejam saciadas, há que produzir o necessário, perdoe-se-me a redundância. Ora, assumindo estas duas premissas como verdadeiras, o que julgo pacífico, chega a altura de referir o óbvio: 20 milhões de pessoas têm mais necessidades que 10 milhões de pessoas. Essas necessidades (pensemos no básico: pão, leite, presunto ou sapatos) rapidamente estimulariam a economia a produzir o que fosse necessário. Aí entrariam os desempregados, que aproveitariam o que o mercado reservara para eles: a produção de pão, leite, presunto e sapatos. Mais cedo ou mais tarde (porque as vantagens comparativas perseguem as pobres e inocentes economias) aquilo em que os portugueses fossem comparativamente mais competentes seria produzido por portugueses e aquilo em que os chineses fossem comparativamente mais competentes seria produzido por chineses.
Para colocar isto num plano super simplificado, até porque nem todos têm de ter noções de Economia, deixo uma pergunta: entre 1950 e 2000 a população portuguesa teve um aumento de, grosso modo, dois milhões de pessoas, temos dois milhões de desempregados?
O furor da obamamânia fez-me ter vontade de ler este livro. Já li um pouco e a única nota que deixo é que poderia ser um belo livro de economia, não se desse o facto de o autor o ter feito como se fosse um panfleto propagandístico. Vamos lá a ver o que é que o Obama quer mesmo fazer. Quando o acabar, faço um post com algumas notas.