A máfia da blogosfera
12
Jul 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 15:08link do post | comentar | ver comentários (9)

disto, lembrei-me de escrever uma coisa que já estava para escrever há um bom tempo. Quando houve as eleições americanas, que interessaram mais a alguns portugueses que a muitos americanos, lembro-me de o Jon Stewart no Daily Show estar de forma constante a atacar a parelha republicana Palin e McCain, por um lado, e a fazer campanha pela parelha democrata Biden e Obama, por outro. Lembro-me até que, nessa altura, havia muitos clips do Daily Show aqui. Isto por si só não tem nada de curioso, que na América as coisas são muito transparentes neste âmbito. O verdadeiramente interessante veio depois. É que logo a seguir às eleições, Jon Stewart passou a ser oposição como os Gato Fedorento por cá são. O Daily Show retomou a sua actividade: roer as canelas de quem habita a Casa Branca. Com isso passou a ser menos vezes publicado ali, é certo, mas ganhou a minha admiração pela independência e razoabilidade.

Isto tudo porque, em Portugal, as eleições funcionam como apostas. Muitas vezes nem defendemos quem melhor nos defende. Defendemos a pessoa que está no partido que já antes tínhamos defendido (e não é admissível que tivéssemos errado na avaliação do partido no passado). E depois das eleições, em vez de sermos objectivos a analisar a governação, roendo as canelas de quem a exerce, teimamos que fizemos a escolha perfeita. É que não é admissível que o candidato que se apoiou seja, let's say, humano e, como tal, imperfeito - deve ser sinal de fraqueza. Depois acabamos com aquela malta estranhíssima que consegue defender o indefensável - coisas a que se oporia num outro contexto - apenas porque apostou no cavalo errado, ou apostou num cavalo imperfeito, e tem de ir com a aposta em diante até a ganhar.

E é assim que funcionam as mentes fechadas, militantes, sofredoras: preferem ver os calos pisados a compreender que, mesmo que seja de todos o melhor, o candidato que apoiaram não é, de todo, perfeito. Como nenhum pode ser. Eu apoio uma candidatura para as próximas legislativas, é certo. Mas é igualmente certo que a partir de dia 27 de Setembro as palmadinhas nas costas acabam e vou ser muito pouco negligente na crítica.


09
Jul 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 21:33link do post | comentar | ver comentários (12)

Um tipo escreve umas coisas sobre a eutanásia e em dois dias vê-se com 63 comentários. E ainda não deve ter acabado.


26
Jun 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 10:26link do post | comentar | ver comentários (4)

Não é novidade, mas agora que morreu, a coisa agudizou-se. Ao comentar a morte de Michael Jackson há sempre quem não resista a condená-lo, mais ou menos subtilmente, por ter renegado as suas origens, por ter feito tantas operações e por ter ficado aquilo que todos sabemos. Pois eu, por mim, não o condeno nem nunca conseguiria condená-lo. A culpa da angustia de um homem por não conseguir viver em paz com aquilo que é nunca pode ser sua. Se Michael Jackson não era feliz preto, é porque nunca o deixaram ser feliz. O nojo um homem por si mesmo não nasce com ele, não pode nascer, é-lhe causado por quem o rodeia. Por quem não lhe comprou um disco porque, afinal, era só um preto de merda a cantar umas cantigas. Quem condena Michael Jackson pelo que fez, deveria condenar-se a si próprio por todas as vezes que criou em alguém a vontade de fazer o mesmo, multiplicando-lhe a angustia por não o conseguir fazer. O homem que morreu ontem, que claramente não é o homem que nasceu há cinquenta anos, é um produto do nosso mundo, não é uma coisa à margem que se autodeterminou. Por isso, em vez de dizerem barbaridades, fiquem calados e, no máximo, oiçam as músicas e agradeçam-nas.


25
Jun 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 23:31link do post | comentar | ver comentários (3)

Quando morre alguém assim, é uma parte do mundo e uma parte de nós que também vai, mais não seja por nos termos habituado a viver com a sua arte na cabeça. Michael Jackson foi, é e será sempre o maior dos artistas. Cinquenta anos entre nós deram-lhe esse estatuto. Imaginemos o que seria se tivesse tido oportunidade de prolongar um pouco mais a sua vida.

 

 

 

 


01
Jun 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 09:12link do post | comentar

 

Tenham todos um dia da criança memo bué da fixe.


14
Mai 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 19:22link do post | comentar | ver comentários (2)

A Eugénia desafia-me a indicar quinze séries televisivas de que goste ou tenha gostado. A verdade é que não vejo muita televisão e não sou propriamente fanático por séries, no entanto aqui vão algumas inesquecíveis, pelo menos para mim. Não são quinze, estão lá perto: Dr. House, The Simpsons, South Park, Rex, Gato Fedorento, Commander in Chief, A bit of Fry and Laurie, Monty Pithon, Prision Break, Third Rock from the Sun, Mr. Bean. 

Reencaminho agora para a Daniela, para o Daniel, para o João, para o Jorge e para o Rui.


13
Mai 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 21:10link do post | comentar | ver comentários (1)

Correu um dia treze de maio sem que eu tivesse ouvido canções esganiçadas.


08
Mai 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 09:22link do post | comentar | ver comentários (2)

maldita inveja. sinto um palpitar no peito quando leio aquilo que só de dentro pode vir. leio verdadeira arte feita de letras e palavras e sons e ideias e depois penso se consigo. e não, não consigo. não sei inventar metáforas lindas que não lembrariam ao diabo, e para que se use tão amiúde este ditado é porque é grande a criatividade do cornuno, não sei inventar histórias que não aconteceram nunca e dificilmente altero histórias que aconteceram já. dizem que ler é mais importante que escrever. que se foda quem o diz. se não houver quem escreva as maravilhas que por aí se lêem, não há quem possa ler. idiotas.

vêem, e isto é uma pergunta na qual não quero por ponto de interrogação porque é feio, é de todos os pontos o mais feio. já me irritei com isto. maldição. é ir lendo, pode ser que alguma coisa entre, influencie, afinal, fala-se tanto das influências deste e daquele que, vai na volta, um gajo aprende a arte sem ser propriamente artista, mas apenas observador, no caso leitor, atento. enfim, é voltar para a realidade das parvoíces dos mandantes e das parvoíces dos serventes. é isso que somos não é, nova pergunta, serventes de pedreiros, que de obras percebem muito pouco. e lá vem a metáfora política. porra. e o delírio que nunca mais acaba e agora pensei que se calhar era melhor nem publicar isto, que ainda me julgam louco. de louco todos temos um pouco, já lá diz o povo e sem razão nenhuma, que loucura é coisa que não tenho na cabeça. e agora estou a achar piada a isto, já passou a inveja, ora, somos todos amigos e camaradas nisto de meter a mão na massa da nossa língua. vá, vou parar, já estou a cansar e já estou cansado. foi bom este bocadinho.


06
Mai 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 21:53link do post | comentar | ver comentários (3)

Estou cansado.

Dois dias sem escrever um textinho que seja para amostra, dois dias em que só vim a casa para dormir. Hoje foi quase, quase o terceiro. Tenho comentários interessantíssimos à espera de ser respondidos, tenho textos noutros blogues que gostava de comentar, ouvi há pouco falar de uma nova entrada no mercado da electricidade português e li aqui e ali qualquer coisa sobre maizena. Tinha vontade de falar disto tudo e mais qualquer coisinha, que da fama de fala-barato não me livro. Mas hoje estou cansado. Amanhã, se não for tarde demais, escrevo sobre tudo isto e ainda sou gajo para publicar aqui o que fui dizer hoje à Gulbenkian.

Agora, estou cansado, sei que me estou a repetir - é do cansaço, e vou ler. O último a sair que apague a luz e feche a porta.


03
Mai 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 13:47link do post | comentar | ver comentários (3)

Ando desvairado e a culpa é d' "eles". Tenho em lista de espera um sem número de livros à espera de ser lidos. Não vou escrever aqui os títulos, porque as editoras não me pagam e recomendações sérias só as faço depois de ler, nem que seja um bocadinho. Mas a questão é esta, o cabrão do tempo não estica, quero ler mas não consigo. E depois, o que é que faço, feito estúpido? Vou à Feira do Livro e compro mais e mais. E não satisfeito, ainda programo mais dias para ver se apanho livros do dia decentes. E assim vou, com uma prateleira "por ler" cada vez mais cheia e que só se vai ver mais aliviada lá para julho ou agosto, se Deus quiser e o tempo ajudar. A minha sorte é que, para os que padecem da minha doença, arranjaram um nome bonito: bibliófilo. Nada de drogados ou viciados, apenas bibliófilos.


30
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 15:31link do post | comentar

Sssht! Calem-se!, era o que eu dizia às pessoas que pareciam não saber onde estavam quando começavam a conversar e a rir alto, qual pagode, enquanto tentava ouvir e observar o Felizmente há Luar! em toda a sua plenitude. Que a peça é excelente, tanto quanto o seu pai Luís de Sttau Monteiro, é, mas sem interpretação não passa de um amontoado de palavras num papel que antes estava em branco. Foi magnífico. A Matilde, aquela que a seguir ao Gomes Freire que nunca aparece é a personagem da peça, foi interpretada pela Maria do Céu Guerra, uma das grandes senhoras da nossa praça. Enfim, tremi, lacrimejei, revoltei-me, que diabo!, senti pena e ri, soltei até uma ou duas gargalhadas indisfarçáveis. E, mais do que tudo isso, que o bom velho Luís queria isso mas não só, pensei. Pensei em cada frase. No Manuel, aquele lúcido plebeu que se via de asas cortadas, na pobre Matilde, na história que poderia ser contada hoje, tirasse-se a fogueira e a forca, e em tudo. Fixei frases, que mudadas ou estáticas me ressoarão na cabeça sempre que vierem a propósito
 

«Ensina-se-lhes que sejam valentes, para um dia virem a ser julgados por covardes! Ensina-se-lhes que sejam justos, para viverem num mundo em que reina a injustiça!
Ensina-se-lhes que sejam leais, para que a lealdade, um dia, os leve à forca!
Não seria mais humano, mais honesto, ensiná-los, de pequeninos, a viverem em paz com a hipocrisia do mundo?
Quem é mais feliz: o que luta por uma vida digna e acaba na forca, ou o que vive em paz com a sua inconsciência e acaba respeitado por todos?» (Matilde)
 
«Numa terra [a nossa terra] onde se cortam as árvores para que não façam sombra aos arbustos...» (Matilde)
 
«Se há guerra, se temos o inimigo à porta - Aqui d'el-rei que a terra é de todos e todos a temos que defender, mas, batido o inimigo, chegada a época das colheitas, quando se trata de comer os frutos da tal terra que é de todos, então não! Então a terra já é só deles!» (Manuel)

29
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 17:26link do post | comentar | ver comentários (2)

Há pouco ouvi na televisão, o canal não me perguntem, um indivíduo americano a questionar-se sobre o porquê de escrever um blogue.

A pergunta deixou-me a pensar. Principalmente por causa dos argumentos que o tipo apresentava: porque não ir ao cinema ou ler um jornal ou um livro em vez de publicar delírios numa periodicidade quase diária? E enquanto pensava isto, pensei: e se todos pensássemos assim. Imaginemos que todos preferiríamos consumir a produção alheia em vez de produzirmos nós mesmos algo, seja bom ou mau. Não haveria nada. Não haveria jornais, para quê publicar um jornal?, não haveria livros, para quê escrever um livro?, não haveria arte, para quê pintar um quadro?, e tudo o que nos faz ser aquilo que somos deixaria de existir e passaríamos a ser o que não somos.

Escrever um blogue dá trabalho, é verdade. A falta de assunto que tantas vezes atormenta o juízo dos free-lancers como eu, a falta de conhecimento sobre determinadas coisas que faz com que textos nossos sobre isso sejam simples parvoíces, a falta de informação recolhida, que faz com que meio mundo fique à porta do blogue que queremos bom. Dá trabalho. Mas ao menos dá-nos, pelo menos a mim dá-me, a satisfação de saber que posso discutir as minhas ideias, colocá-las à prova e contribuir, pelo menos de alguma forma, para que haja ainda humanidade por estas bandas.

Fôssemos todos como o senhor que ouvi há pouco na televisão, num canal que mais vale não me perguntarem, e o mundo tornar-se-ia um lugar ainda mais estranho.


25
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 11:07link do post | comentar | ver comentários (1)

Ontem à noite fui assistir ao fogo-de-artifício de Almada. Festa rija, todos os anos, ou não fosse a Câmara comunista, o que não tendo nada a ver, explica muita coisa. Ora este ano a celebração foi composta  por actuações avulsas de gente desconhecida, a quem poderia chamar sem nome, não fosse o título servir para o que vou dizer mais em baixo, pela intervenção do vereador da Cultura, o grande, o magnífico, António Matos, cujo discurso foi uma amálgama de rockice e analfabetismo, pela intervenção da Presidente Maria Emília, que gritou chorosa que nos amava a todos e a quem eu respondi, o quê, não digo. E depois do passeio das figuraças veio o momento solene: Almada cantou o Grândola Vila Morena. É um momento que me faz arrepiar sempre, mas deixemos isto por agora, que os meus arrepios pouco interessarão aos estimados leitores. Cantada a Grândola, começou o fogo-de-artifício. Ó espectáculo mais extraordinário, começou com a Grândola Vila Morena como banda sonora. A marcha de fundo, a canção e a luz fizeram a noite. O pior foi quando a Grândola acabou e o fogo tinha de continuar. Para este problema, o DJ arranjou solução fácil: colocou na Praça da Liberdade as músicas It's All About Us, La Tortura, One Love, Baila Morena e acabou com um remix ranhoso que ninguém parecia conhecer nem tão-pouco gostar. Uma estupidez sem nome fazer do 25 de Abril e da sua celebração um Carnaval, uma mini-discoteca improvisada, aquilo.


24
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 18:42link do post | comentar | ver comentários (2)

No dia 24 de Abril, tal como quatro meses antes, é suposto que um blogger que se preze escreva um texto bonito. É, é suposto. Eu, desgraçado de mim, não consigo. E não consigo por um motivo muito simples: não sei o que foi o 25 de Abril.

Já li nos livros, já li na rede, já vi na televisão, já ouvi nas reuniões familiares, já vi os filmes, passei a vida a aprender Abril e, por mais que me digam, que me contem, que me expliquem, continuo sem sabê-lo, mesmo tendo mais informação que muitos dos que já por cá andavam na madrugada do dia 25 de Abril de 1974. E nunca o saberei. Nunca o saberei porque há coisas que não se aprendem nos livros, na rede, na televisão, nos filmes, nem nas reuniões familiares. Há coisas que só se aprendem vivendo. E eu, para felicidade minha, não vivi Abril. Felicidade, porque vivê-lo significaria ter passado por tudo aquilo que quem o viveu passou. Ter uma vida, seria vida?, miserável em que escrever num qualquer lugar que a nossa vida era miserável era crime. Viver, seria viver?, com medo de dar um passo e ser apanhado a fazer coisa nenhuma e condenado à prisão por ter nascido numa terra estranha, numa época estranha. Sentir tudo aquilo e calar, a bem dos brandos costumes e a mal do futuro que me esperasse.

É, não sei o que foi Abril. E não sei o que sinto, se confusão se pena, em relação àqueles que, não tendo vivido Abril, querem voltar ao país de Março. Se querem aquela merda para vocês e para os vossos filhos, mon frères, tratem de comprar uma ilha e fazer o festim bem longe.

Não sei o que foi Abril, mas há uma coisas que sei: sabe bem não conseguir escrever sobre o que Abril foi.


15
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 14:23link do post | comentar | ver comentários (4)

Se há coisa estranha nesta vida é este perturbador hábito, qual hábito, vício de blogar. O que no início começa como uma descoberta, ai que giro!, acaba por se tornar uma rotina. Ouvir as notícias da televisão, ler os jornais possíveis, cirandar pela blogosfera e, em menos de um ai formar uma opinião e estar preparado para a defender como se da nossa vida se tratasse. E não é só isto. O mais impressionante é que revelamo-nos, sem pudor, a desconhecidos. Sabem-nos, se quiserem. Compreenderem-nos, isso, já é outra coisa.

Mas a verdade é que é bom fazer este exercício. Discutir as nossas mais profundas convicções, tomar contacto com outras perspectivas e até, por vezes, criar quase-amizades, companheirismos. É bom, quase sempre. Quase sempre porque depois surge a outra face da moeda. Se da Internet podemos tirar muitos proveitos, dela virão, sem sombra para dúvidas, muitos dissabores. Gente que, também não nos conhecendo, faz questão de nos chamar aquilo de que se consegue lembrar. Gente que, e reforço que não nos conhecem, se diverte, será divertimento na certa, a mandar-nos abaixo. Estúpido. Idiota. Lambe-botas. Diminuido. Otário. Burro, mesmo. É tudo uma questão de originalidade.

Até agora tem sido positiva esta experiência, mas o prato dos contras começa a pesar e o ânimo já não é o mesmo. A ver vamos, a ver vamos.


13
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 14:55link do post | comentar | ver comentários (3)

Todos os anos, na terra que visito por laços de sangue a ela me ligarem, se realiza, na primeira segunda-feira que se segue a cada Páscoa, que é como quem diz no dia seguinte ao da festividade cristã, o folar. Em bom rigor deveria eu chamar-lhe visita pascal, que é mais canónico, mas muito terreno sou e por isso lhe chamo o que os terrenos lhe chamam: folar que é por causa da tosse.

Ó ritual mais bimbo e ao mesmo tempo mais bonito. Toda a aldeia se veste a rigor, as senhoras com os vestidos mais bonitos que compraram para um qualquer casamento de um qualquer familiar mais o perfume e o colar de pérolas que o não são bem. Os senhores, que no dia-a-dia são homens do campo e neste se metamorfoseiam, vestem as suas camisas claras, os seus fatinhos de domingo e o sapatinho de verniz, que a efeméride não pede menos e má figura não podem fazer. Os jovens, esses, juntam-se em bando, que em terras desenvolvidas do litoral se chamaria gang, e correm as casas todas que podem, tentando até as que não podem, comendo muito e bebendo muito mais. E há o padre, com as pequenas acólitas: uma carrega uma sineta que lhe pesa a olhos vistos, outra carrega um potinho de água que se diz benta por pelo padre ter sido benzida. E há, por último o Sacristão que carrega o elemento principal: o Jesus crucificado que há-de ser beijado por tudo quanto é gente boa. Ele os há que beijam o filho de Deus em todas as casas por onde passam. Eu, que desconfio que tanta beijoquice será pecado, beijo uma vez, a primeira e última, para o beijar novamente no ano seguinte.
E assim se passa o dia, o padre com a sua comitiva visitando pascalmente os lares que pedem bênção, os jovens que se divertem fingindo-se homens, os senhores que não resistem a desapertar as finas vestes e a voltar ao que são no dia-a-dia e as senhoras que se dividem entre as que se aventuram no copinho e na bochecha por ele rosada e as que mantêm a pose até à noite, para voltarem a ser mulheres no dia que se segue.
Ó ritual mais bimbo e ao mesmo tempo mais bonito, até para o ano.

 

Nota: a ideia do título foi roubada, e muito bem roubada atrevo-me a dizer, à Eugénia de Vasconcelos do Mátria Minha. O seu a seu dono, que eu não sou de roubar sem, pelo menos e por delicadeza, informar.


25
Mar 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 20:15link do post | comentar | ver comentários (1)

Um dia, passeava eu no parque ao pé do sítio onde moro, quando fui abordado por um desconhecido que me via escrever no meu fiel Moleskine. Porque escreves, perguntou o tipo (digam lá que não sei imitar O Mestre), Não sei, respondi eu num misto de assombro e curiosidade pelo que dali viria. Como não sabes, insistiu o homem cujas ramelas e cabelo desgrenhado faziam adivinhar uma vida de rua, daquelas que não desejamos a ninguém. Ora, não sei porque nunca pensei nisso, respondi eu. Então pensa, mas pensa mesmo, sem pressa, essa puta má conselheira. E pensei, pensei no que me levava a escrever. E aquela voz que mais ninguém ouve quando pensamos começou a falar. Falava, falava, mas não dizia nada: parecia ela própria confusa, sem rumo. A ideia começou a construir-se: primeiro com tijolos de lama que, como por magia, se iam transformado em robustos blocos de granito. A sua simplicidade, a da ideia, era quase comovedora. Porque gosto, disse eu ao velho vagabundo com um sorriso indisfarçado nos lábios e no olhar. E é verdade: escrevo porque gosto. Gosto da forma como posso, sem pudor ou constrangimentos, misturar palavras que formam ideias e transmitem sentimentos, sensações. Gosto de me aventurar a imitar os clássicos. Que tal um pensativo cigarro, Carlos? Sabendo de antemão que cópia minha a tão ilustre peito jamais será sequer considerada como tal. Gosto de encriptar o que quero dizer, mais não seja para gritar sem que ninguém oiça o que vivo e sinto. Gosto do verbo, do pronome, do adjectivo, do advérbio e até das proposições, esses clubes restritos dentro do mundo da língua que é a nossa. E gosto de inventar que passeava num parque ao pé do sítio onde moro, quando fui abordado por um desconhecido que, ao ver-me escrever no meu fiel Moleskine, me perguntou porque escrevia, apenas para poder dizer a quem me lê por que escrevo sem fazer do blogue um amontoado de delírios. Apanhado.

É, gosto de escrever sobre nada. E agora que olho para o meu blogue vejo que tenho escrito sobre muita coisa, demasiada: matéria que o esquecimento tratará sem dó nem piedade. Pois que se o que escrevo tem de ser esquecido, ao menos que me dê prazer enquanto não esqueço. Tudo isto para dizer que deixei de querer saber das audiências fáceis, das referências do Público, das referências dos outros blogues ou do raio que o parta. A partir de agora este blogue é meu e para mim. Quem gostar, é convidado a sentar-se a meu lado, mas não no meu lugar.

Primeiro Aniversário: Já vou tarde

13
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 10:31link do post | comentar | ver comentários (1)

Tudo vale a pena

Se a alma não é pequena

 

Fernando Pessoa, Mensagem


12
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 14:30link do post | comentar

Sem a loucura que é o homem

Mais que a besta sadia,

Cadáver adiado que procria?

 

Fernando Pessoa, Mensagem


19
Jan 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 21:06link do post | comentar

O Afilhado vai disponibilizar, em directo, o debate "Crise, Globalização e Intervencionismo do Estado". Começa às 21:30. Agora o vídeo ainda tem a "publicidade", mas quando começar o debate, a transmissão muda automaticamente.

 


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