A máfia da blogosfera
25
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 12:22link do post | comentar | ver comentários (6)

Neste trigésimo quinto aniversário desta nossa terceira República, existe um defeito que lhe é apontado, muito bem evidenciado pelo João Távora: o da manifesta partidocracia. A verdade é que, tirando a extrema-esquerda, onde houve algumas mudanças, o panorama político nacional manteve-se quase estático. Os mesmos partidos, as mesmas pessoas e a asfixiante sensação que o poder está na mão das mesmas pessoas ganhe quem ganhar, que o círculo é restrito e está vedado à alternativa não demagógico-populista. Mas para além do diagnóstico da situação, que se afigura desastrosa e que me leva a mim e não só a temer pelo futuro, é necessário procurar as causas. A verdade é que ao longo dos últimos anos têm surgido alternativas aos partidos existentes, tal como o Movimento Intervenção e Cidadania, o Movimento Esperança Portugal, o Movimento Mérito e Sociedade, o Partido Nova Democracia, o Partido da Terra, o Partido Humanista, o Partido Operário de Unidade Socialista, o Partido Nacional Renovador e provavelmente haverá outros para além dos que referi. O importante é que só aqui há oito partidos, oito, com um espectro ideológico bastante alargado: desde os socialistas do POUS aos nacionalistas do PNR e nenhum tem assento parlamentar.

Muitos imputam as culpas à comunicação social, como se a SIC e a TVI tivessem algum tipo de obrigação para com estes partidos. A RTP, por ser pública, já é diferente. Mas, ainda assim, isto não é motivo suficiente.

Pessoalmente, aponto dois motivos para que estes partidos não ganhem notoriedade. Em primeiro lugar, não se mostram ao público. Actualmente existem inúmeras formas de apresentar ideias, destaque para os blogues e para as redes sociais. E a verdade é que muitos destes partidos não utilizam estes meios que quase não comportam custos para se apresentarem. Mas não é só isto. Não pode ser só isto. Tirando o Bloco de Esquerda, os partidos com assento parlamentar também fazem muito pouco uso das redes sociais. Por isso aponto um outro motivo: o sistema de financiamento dos partidos. Em Portugal, os partidos são financiados pelo erário público numa lógica de proporcionalidade. A título de exemplo pego nas eleições legislativas. Segundo a lei do financiamento dos partidos, caso um partido obtenha mais de 50.000 votos, número a que nenhum dos partidos acima referidos a concorrer atingiu, recebe, por cada voto, 1/135 do Salário Mínimo Nacional. Para facilitar, vamos imaginar que nas próximas eleições os partidos concorrentes tinham exactamente os mesmos resultados que obtiveram em 2005. O Partido Socialista receberia 8.578.020€, o Partido Social Democrata receberia 5.464.133 €, a Coligação Democrática Unitária (PCP-PEV) receberia 1.440.000 €, o Centro Democrático Social receberia 1.383.073 € e o Bloco de Esquerda receberia 1.214.690 €. Estes valores permitem a estes partidos um investimento imenso em comunicação, contratando agências especializadas, em acções de campanha, em comícios, convenções e congressos, tudo eventos que lhes permitem uma projecção mediática muito considerável.

Por trazer esta desigualdade de oportunidades aos Partidos, por ser uma despesa pública de um volume inaceitável, por não permitir uma verdadeira regeneração da política e por ir contra a própria natureza dos partidos, que são organizações privadas compostas por pessoas que por elas se interessam e que, como tal, deveriam ter como receitas apenas as que fossem provenientes de quotas ou donativos, considero que o fim do financiamento dos partidos pelo Estado seria um passo gigante para a qualificação da democracia.


20
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 17:49link do post | comentar | ver comentários (7)

O Carlos Santos, com o método habitual, respondeu ao meu post sobre o salário mínimo. Ultrapassando, por agora, a parte das ofensas, sinal de quem não estará muito convicto das suas ideias, e a parte dos atropelos à nossa amada sintaxe, vou tratar de responder.

O distinto Santos fez algo de extraordinário: pegou numa excepção para demonstrar uma teoria que se pretende geral e a excepção em que pegou foi do mais infeliz que pode haver. Nem parece seu este tipo de discurso falacioso, ai.

Basicamente, muito basicamente, a base, estou a repetir-me, não faz mal; argumentativa do Santos é que como há situações de monopólio em que o empregador dita as regras do jogo, a escolha não é verdadeiramente livre. Curiosamente, o Santos escreve, a determinada altura, que a população da terra, das duas uma, ou ia trabalhar para o monopolista ou para o campo, para a agricultura. E o Santos coloca esta situação como eterna: nada mudará. Não haverá cooperativas agrícolas rentáveis, não haverá mais industriais, os trabalhadores não serão empreendedores, nada. Uma distopia eterna: um capitalista malévolo, uma alternativa miserável. O mundo tal como ele é.

Percebe-se a falácia, ou é necessário ser mais óbvio? Ninguém nega que a abolição do salário mínimo traria alguns, senão mesmo muitos, problemas numa fase inicial. Mas, do mesmo modo, julgo que é lógico, do mais lógico que pode haver, que ao haver um estímulo negativo ao trabalho por conta de outrem haverá, no outro lado da balança, um estímulo positivo ao empreendedorismo.

Depois o Santos pega naquele que é o argumento interessante: o da heterogeneidade ao nível das formações profissionais. Sim, o trabalho não é homogéneo, no entanto, nada obsta a que um mesmo indivíduo possa ter competências diferentes. Se o Santos de um momento para o outro se visse num mundo em que ninguém o queria como professor, que mundo estranho seria esse, iria segurar-se com a sua distintíssima formação ou iria aprender outra qualquer coisa para que pudesse trabalhar? Parece-me óbvia a resposta. Aprender uma nova profissão demora tempo, é verdade. Mas há uma série de mecanismos de solidariedade social, e eu defendo que seja voluntária, o que não é o mesmo que ser contra a sua existência, que permitem ao indivíduo viver com dignidade, sem que seja imputada ao empregador toda a responsabilidade pelo facto de o mundo ser um lugar estranho. 

 

E já agora, Santos, como não me aceitaste o comentário no teu distintíssimo "O valor das ideias", vou colocá-lo aqui - já adivinhava que não o aceitasses, não foi a primeira vez - e a ver se percebes a mensagem:

 

Sr. Doutor,

Vamos lá ver se nos entendemos. Não me conheces de lado nenhum para fazeres um comentário como o que fizeste. Não me interessa nada dizê-lo, mas eu não peço a ninguém para me linkar, ao contrário de alguma malta que conheço cujo desporto preferido é chamar a atenção para o seu blogue em caixas de comentário completamente off-topic. Comentei o meu texto no insurgente porque lá fizeram respostas e achei que era importante ser EU a responder como seu "autor", como tu escreves.
Bom, deixa-me dizer-te que do alto da tua sapiência estás errado. Agora não estou em casa nem tenho tempo para fazer uma resposta, mas assim que tiver tempo faço-a.
Sabes, até és um tipo inteligente. Se não fosses aquilo que és na blogosfera podias ser bastante respeitado.
De qualquer forma, não voltes a insultar-me que eu também não te insultarei. Não te conheço, não te quero conhecer e quero distância de tipos como tu.

Até logo

P.S.: «blogue a sério»? Este? Não sabes o que é um blogue a sério.


17
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 10:34link do post | comentar | ver comentários (4)

 

O motivo que me leva a ser contra as off-shores é muito simples. Se uma empresa tem os proveitos de pertencer a um Estado, vendo-se protegida pela lei, justiça e segurança, qual é o fundamento para que lhe seja permitido não dar as contra-partidas?

A questão é verdadeiramente profunda a meu ver. Não me interessa para a análise as consequências práticas da existência de off-shores (as lavagens de dinheiro, por exemplo), interessa sim analisar o próprio princípio de um paraíso fiscal. Toda a lógica do funcionamento do Estado, o contrato social, assenta numa relação muito simples: o indivíduo tem proveitos e em troca tem de dar contra-partidas. Existe maior segurança, não se verificando o hobbesiano espectáculo de horror do Estado de Natureza, e essa segurança tem de ser paga, tem de ser financiada por alguém. Ora, se todos dela beneficiam, fará sentido que a alguns seja permitido não contribuir, usufruindo do mesmo modo? A menos que todos concordem em “oferecer” estes benefícios à pequena franja que neste momento não os paga, não. Parece-me mais que óbvio que nem todos estão dispostos a tal.

 

Na imagem: Gibraltar, um paraíso fiscal.


16
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 16:35link do post | comentar | ver comentários (22)

Esqueçamos que estamos em crise. Esqueçamos simplesmente os condicionalismos actuais e prendamo-nos apenas com a discussão abstracta deste assunto. Bem sei que muitos me dirão que não o posso fazer. Que se danem, que no meu blogue faço o que me apetecer.

A primeira pergunta, retórica, que a resposta sei-a eu, é: como se define um preço? Haverá algo neste mundo cujo valor monetário seja intrínseco? Há algum bem que em qualquer parte do mundo, em qualquer momento da História, tenha tido o mesmo valor? Não. E a razão é muito simples. Por muito que se faça por esquecer este pequeno detalhe, o preço do que quer que seja é estabelecido pelos mecanismos de oferta e de procura. Vale aquilo que o comprador estiver disposto a pagar, conjugando essa disposição com a do vendedor. Quanto queres, quanto dou. Nada mais básico, nada mais fundamental. É isto o preço.

Descoberto que está como se estabelece o preço do que quer se seja, que outra forma não existe que seja tão fiável, como é que se pode aceitar que o Estado fixe preços mínimos, como o preço mínimo pago pelo trabalho, mais comummente conhecido por “Salário Mínimo Nacional”?


10
Abr 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 19:26link do post | comentar | ver comentários (8)

Alguns personagens afirmam à boca cheia que “todo o ser humano tem direito ao trabalho”, alguns, que primam pela redundância, acrescentam no fim “com direitos”, mas estes vou esquecer. A afirmação é bonita, como bonitas são tantas outras provenientes da boca das pessoas que a fazem, mas terá realmente fundamento?

O que significa ter direito a algo? Um direito é, simplesmente, uma vontade de um indivíduo que implica uma obrigação por parte de outro ou outros e cujo fundamento lhe dá legitimidade. Por exemplo, temos o direito à vida, pelo facto de a prezarmos e pelo facto de todos aceitarmos esse direito como tal; assim, todas as pessoas têm a obrigação de não me matar. Vamos aplicar isto ao trabalho. Eu quero ter um emprego remunerado, por isso, afirmo que tenho direito a tal. Mas para eu ter direito a um emprego remunerado, tem de haver alguém com a obrigação de mo dar. Haverá indivíduo ou grupo de indivíduos que tenha obrigação moral de me arranjar um trabalho? Não. É óbvio que não. Levemos a afirmação ao limite e imaginemos que todos exigíamos um trabalho remunerado a alguém. Quem seria o empregador?
Não existe, como é evidente, um direito ao trabalho. No entanto, pelo romantismo e beleza da afirmação ainda há quem a apregoe e ainda há quem a assimile, acriticamente, como certa. É só mais uma.
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28
Mar 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 08:11link do post | comentar | ver comentários (4)

Imaginemos três vizinhos, o Alberto e o Joaquim e o Manuel.

Um dia, fazem uma reunião e é votada uma proposta: retirar, todos os meses, metade do rendimento ao Alberto e distribuir a quantia pelos três de forma igual. O Alberto diz que não é justo, que trabalhou para ter o que tem e que aquilo é um roubo. Mais, eles não têm o direito a fazer isso se ele não concordar. O Manuel e o Joaquim dizem que como vive no bairro, tem de fazer o que a maioria do bairro decidir, e se a maioria do bairro votar a favor da proposta, ele tem de se sujeitar. A proposta é votada e o sim ganha. Foi a primeira.

Noutro dia, fazem outra reunião. Tem-se visto que o Joaquim tem andado a comer muitos bolos e que isso tem afectado negativamente a sua vida. Faz-se uma votação à seguinte proposta: proibir os vizinhos daquele bairro de comer bolos. O Joaquim diz que tem o direito de fazer o que quiser com a vida dele, mas os outros respondem novamente que ele tem de obedecer à maioria.

Depois, o Manuel adoece. Fica internado no hospital, em coma. O bairro reúne e tanto o Alberto como o Joaquim decidem que o melhor é acabar com a vida do Manuel. O Manuel nunca disse se queria que tomassem uma decisão daquelas naquela situação, mas a maioria tem de ganhar.

O bairro reserva-se o direito de decidir cada vez mais como é que cada um deve viver. A liberdade de cada um deixa de ter valor e apenas a vontade de todos importa.

Ainda bem que é tudo um exercício mental e isto não acontece na realidade, não é?


27
Mar 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 22:27link do post | comentar
 
«Imagina, pois, que acontece uma coisa deste género, ou em vários navios ou num só: o capitão, superior em tamanho e em força a todos os que se encontram na embarcação, mas um tanto surdo e com a vista a condizer, e conhecimentos náuticos da mesma extensão; os marinheiros em luta uns contra os outros, por causa do leme, entendendo cada um deles que deve ser o piloto, sem ter jamais aprendido a arte de navegar nem poder indicar o nome do mestre nem a data do seu aprendizado, e ainda por cima asseverando que não é arte que se aprenda, e estando prontos a reduzir a bocados quem declarar sequer que se pode aprender; estão sempre a assediar o capitão, a pedir-lhe o leme e a fazer tudo para que este lhes seja entregue; algumas vezes, se não são eles que o convencem, mas sim outros, matam-nos, a esses, ou atiram-nos pela borda fora; reduzem à impotência o honesto capitão com drogas, a embriaguez ou qualquer outro meio; tomam conta do navio, apoderam-se da sua carga, bebem e regalam-se a comer, navegando como é natural que o faça gente dessa espécie; ainda por cima, elogiam e chamam marinheiros, pilotos e peritos na arte de navegar a quem tiver a habilidade de os ajudar a obter o comando, persuadindo ou forçando o capitão; a quem assim não fizer, apodam-no de inútil, e nem sequer percebem que o verdadeiro piloto precisa de se preocupar com o ano, as estações, o céu, os astros, os ventos e tudo o que diz respeito à sua arte, se quer de facto ser comandante do navio, a fim de o governar, quer alguns o queiram quer não — pois julgam que não é possível aprender essa arte e estudo, e ao mesmo tempo a de comandar uma nau. Quando se originam tais acontecimentos nos navios, não te parece que o verdadeiro piloto será apodado de palrador, lunático e inútil pelos navegantes de embarcações assim aparelhadas?»
 
Platão, A República, pp. 275-6

 

 

Partilho com Churchill a ideia de que a democracia é o pior dos sistemas, se exceptuarmos todos os outros. No entanto, não deixo de me questionar sobre os fundamentos dos nossos sistemas quando leio o texto acima. Platão, tanto hoje como há dois mil anos dá que pensar.

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20
Mar 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 10:23link do post | comentar | ver comentários (1)

[via O Insurgente]


28
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 09:22link do post | comentar | ver comentários (9)

Tal como escrevi no último post, nos primódios do socialismo havia desigualdades sociais quase que impostas pelos próprios Estados: a aristocracia era detentora da riqueza e ao povo cabia trabalhar e, se assim entendesse, tentar sobreviver. Dado que apenas a aristocracia e alguma burguesia tinha dinheiro para investir verdadeiramente, as oportunidades estavam condicionadas à partida: nem todos estavam no mesmo patamar. Isto levou, realmente, a uma subvalorização quase dramática dos trabalhores e a uma sobrevalorização dos empresários (capitalistas, como o pessoal gosta de lhes chamar - como se fosse ofensivo). Mas isto aconteceu exactamente, e curiosamente, por causa da intervenção do Estado na fase anterior: apenas alguns tinham riqueza, apenas alguns tinham estudos, a maior parte não tinha nada. As políticas sociais, à data, foram apenas a forma como os Estados tentaram resolver o problema. Se não ganham naturalmente, pois que ganhem por decreto. Surgiram os Welfare Sistems (finais do século XIX na Europa e princípios do século XX na América).

O problema é que, à altura, uma política de redistribuição do rendimento que beneficiasse pobres era apenas o remediar do erro de uma política de redistribuição que beneficiava ricos. Cometeu-se um erro para tentar tapar outro. A coisa funcionou, basicamente, num esquema Robin Hood. Fez sentido à data.

No entanto, e apesar de ter feito sentido na altura fazer-se algo do género, actualmente isto é completamente distituído de significado. Actualmente, e apesar de as oportunidades continuarem a não ser as mesmas à partida, o problema não é sequer semelhante ao de antes e, ainda assim, as políticas sociais de agora são muito mais "pesadas" que na altura.

Actualmente temos aquilo que é mais desejável para uma economia: uma classe média. Temos uma grande parte da população neste limbo entre ricos e pobres e toda a economia, se deixada a funcionar, levará a que haja uma convergência para este centro: os pobres, pelo trabalho (e não a ser sustentados por dinheiro roubado aos outros) tornar-se-ão mais abastados e os ricos, a certa altura acabarão por perder o dinheiro que possuem por algum episódio de incompetência (esta crise é disso demonstrativa).

O Estado, ao precipitar tudo através das políticas sociais faz com que pareça não haver problema quando o sistema está todo podre: mete a carpete em cima do buraco. Se um pobre se tornar abastado com o dinheiro dos impostos alheios, certamente contribuirá para que haja menos desigualdade na repartição do rendimento. No entanto, sabemos que essa "contribuição" não foi pela via normal, não foi pelo trabalho: tirou-se de outros para lhe dar a ele em vez de ele produzir para enriquecer sem ser às custas dos outros. O sistema é semelhante ao que agora se faz com os certificados de habilitações: as pessoas têm a quarta classe, dá-se-lhes um diploma do 9º ano, ou seja, faz-se estatística sem que a pessoa tenha realmente as competências de um 9º ano. A única diferença, para que eu seja rigoroso, é que no primeiro caso a pessoa fica com dinheiro e no segundo caso as competências mantêm-se, mas percebe-se a ideia.

Depois há o problema de fundo: ao promoverem políticas sociais, ou seja, formas de o país sustentar os pobres, o Estado desincentivará  esses pobres a trabalhar. A situação acaba por se perpetuar e aqueles pobres, acomodados à situação, permanecerão empecilhos para os outros, empecilhos que os outros são obrigados a sustentar.


27
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 08:05link do post | comentar | ver comentários (2)

No último post mostrei que dois dos grandes obstáculos à criação de empresas em Portugal são criados pelo próprio Estado: protecção do emprego e burocracias no processo.

Quais são, então, as consequências práticas disto?

Com uma situação de trabalho protegido e obstáculos à criação de empresas, o que vai acontecer é que uma grande massa de população vai preferir o trabalho por conta de outrém, ao passo que apenas uma fina camada da população, a mais competente, com mais capital disponível, vai abrir uma empresa: apenas os loucos ou os ricos abrem uma empresa. A abertura de uma empresa fica mistificada e cria-se quase uma barreira psicológica: nem pensar nisso.

Teremos, portanto, uma grande quantidade de população a querer trabalhar por conta de outrém e muito pouca população a trabalhar por conta própria e à procura de trabalhadores. Como qualquer pessoa irá facilmente compreender, haverá uma sobrevalorização dos empresários e uma subvalorização dos trabalhadores. Regras do mercado, não há nada a fazer. Os trabalhadores, por serem tantos, perdem valor. Assim, os poucos empresários que há serão muito bem remunerados (os trabalhadores, que valem pouco, não se importarão que uma boa parte do rendimento do seu trabalho fique na posse do empregador) e os trabalhadores serão muito mal remunerados (por serem tantos a competir pelos mesmos empregos, terão de baixar o seu preço).

Criam-se desigualdades sociais. Chegando a esta situação (que nos séculos XIX / XX era grandemente causada por o capital pertencer a algumas elites - aristocracia) os governantes sentem necessidade de agir. E agem, regando o fogo com gasolina, mas isso fica para o próximo post.


26
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 20:50link do post | comentar | ver comentários (6)

Há algum tempo que estou em crer que a grande causa, apesar de parecer paradoxal, para o empobrecimento generalizado da população e enriquecimento de apenas uma pequena franja se deve à protecção do emprego, por um lado, e aos obstáculos à criação de empresas por outro. Passo a explicar. Quando um indivíduo chega à idade adulta, tem de optar entre trabalhar por conta de outrém ou trabalhar por conta própria. Obviamente, antes de fazer esta opção, vai considerar os prós e os contras de cada uma. A maioria dos jovem-adultos chegam à conclusão que é preferível trabalhar por conta de outrém numa fase inicial devido à falta de experiência. No entanto, quando a falta de experiência deixa de ser um problema, seria de acreditar que o profissional se fizesse à estrada e criasse o seu próprio negócio, em vez de apodrecer nos quadros de uma empresa alheia. Não acontece.

Na maioria dos casos, um indivíduo que entra, por exemplo, para os quadros de uma empresa permanece aí para o resto da sua vida activa, não tendo qualquer ambição de ter um negócio seu, onde certamente ganharia mais, pois não haveria nenhuma parte do rendimento do seu trabalho que fosse para os donos da empresa/accionistas. É interessante perguntar: porque é que isto acontece? Penso que a resposta é óbvia: não é vantajoso. Olhando para os prós e contras de um quadro de uma empresa abrir a sua própria empresa, veremos que os contras suplantam por completo os prós. Ora vejamos: um quadro de uma empresa tem o seu emprego seguro (a única coisa que o fará perder o emprego será ou a falência da empresa ou uma situação de extrema falta de competência), abrir uma empresa envolve um trabalho burocrático complicado e dispendioso, há o factor risco e ainda a necessidade de capital para investir. No lado dos prós, o único motivo que poderia levar um bom trabalhador a abrir uma empresa seria a possibilidade de auferir mais rendimento pois, por um lado, é o único beneficiário do seu trabalho (numa empresa, uma parte do nosso rendimento vai para o gerente) e, por outro lado, poderá ainda ganhar partes dos rendimentos dos seus empregados, que têm de dar alguma coisa em troca da segurança conferida pelo trabalho por conta de outrém.

Agora, olhemos para os contras a abrir uma empresa. Dos quatro factores enunciados, apenas dois decorrem naturalmente da abertura de um negócio: o risco e a necessidade de capital. Os outros dois: segurança no trabalho por conta de outrém e o trabalho burocrático são obstáculos criados pelo Estado, que podem ser comprovados aqui.

Para já, neste post, não vou avançar mais. No próximo explicarei as consequências disto.


22
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 08:28link do post | comentar | ver comentários (3)
«A legalização do casamento gay implica contestar o princípio do casamento tradicional, definido como uma união entre dois indivíduos de sexos opostos e sem laços consanguíneos. Então, a lei resultante não deverá distinguir entre o direito de dois indivíduos do mesmo sexo, não aparentados entre si, a casar e adoptar filhos, e o direito de três indivíduos consanguíneos e do mesmo sexo à união matrimonial e à adopção. Dito de outro modo, será lógica e juridicamente inadmissível a legalização do casamento homossexual, caso se recuse o seu corolário mais extremo – nomeadamente, o casamento homossexual incestuoso poligâmico

 

Este é um excerto de um texto de Manuel João Ramos, publicado no Sorumbático. Decidi copiar para aqui por ser dos mais lúcidos textos que tenho lido sobre o assunto. Ele está coberto de razão na análise que faz. No entanto, apesar de não concretizar o seu posicionamento, creio que se retiram das entrelinhas que é contra a legalização do casamento homossexual, novamente por ter feito uma redução a um absurdo que não é absurdo.

 


21
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 13:38link do post | comentar | ver comentários (5)

Sou a favor que o Estado permita o casamento entre pessoas do mesmo sexo. E assumo esta posição por achar que é ridículo que o Estado vede o direito a duas pessoas fazerem uma coisa que não afecta absolutamente mais ninguém.

O Eduardo Nogueira Pinto levantou no Prós e Contras um argumento interessante: dado que, naturalmente, de uma relação homossexual não virá descendência, não faz sentido que o Estado interfira. Não faz sentido que o Estado se ponha na cama das pessoas, como ele várias vezes repetiu. E é verdade. O Estado não tem de se pôr na cama de ninguém e está a fazê-lo. Ao existir já um contrato disponível ou havendo a possibilidade de duas pessoas celebrarem um contrato similar, ao proibi-lo, o Estado está a interferir. Está, efectivamente, a pôr-se na cama das pessoas.

Um outro argumento utilizado é o da redução ao absurdo. É muitas vezes frustrante este argumento, pois como defende o Pedro Arroja, por cá não se consegue pensar no abstracto. Então a redução ao absurdo que se faz, por exemplo pelo Francisco Mendes da Silva é, em linhas gerais, dizer: se permitimos que haja casamento homossexual devemos permitir que haja poligamia. O problema é que não há aqui absurdo nenhum. Ainda ninguém me conseguiu explicar por que razão é que não é permitida a poligamia em Portugal. É moralmente errado um indivíduo assinar um mesmo contrato com várias pessoas?

Colocados todos estes problemas ao casamento civil, não seria muito mais útil discutir o próprio casamento civil e os seus limites legais? Essa sim, seria uma discussão interessante.


09
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 17:59link do post | comentar | ver comentários (6)

Os últimos três posts sobre o argumentário pró-aborto, felizmente, geraram alguma discussão positiva. As referências noutros blogues levaram até a que a discussão se alargasse além do meu público habitual, o que é bom. O argumento que hoje quero desmontar é o argumento do alegado direito da mulher a fazer o que quiser com o corpo que é seu. Muito provavelmente serão poucos os argumentos a desmontar depois deste, pois penso que os principais já foram todos tratados e o debate que houve na altura do referendo passou apenas por um repetir constante das mesmas supostas evidências, como esta. Ora, então, uma das defesas da legalização do aborto assenta no direito à mulher de fazer o que quiser com o seu corpo: "o corpo é meu, logo, eu tenho o direito a decidir tudo sobre ele".


05
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 22:09link do post | comentar | ver comentários (14)

Um dos argumentos que mais vezes é repetido por quem defende a legalização do aborto é o das condições ou falta delas para criar um filho. "Se os pais não têm condições para cuidar de um filho, mais vale que façam um aborto". Dito de outra forma, que esta é demasiado eufemística, "É preferível matar uma criança a não lhe dar uma vida de acordo com os padrões da sociedade para dignidade". E não estou a ser demagógico ao dizer que se trata de matar uma criança, já o justifiquei no outro post sobre o assunto. Ora, o que é que me faz considerar que este é um mau argumento para justificar a prática do aborto?

 


03
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 20:07link do post | comentar | ver comentários (4)

Tive sérias dificuldades em escolher o título, isto porque costumo concordar imenso com o que o Pedro Arroja escreve no Portugal Contemporâneo. No entanto, um post por ele escrito sobre os benefícios do proteccionismo numa situação de crise como a que vivemos obriga-me a responder-lhe. Como a resposta é grande, não pode ser feita em comentário.

Vou pegar exactamente no mesmo cenário que Pedro Arroja avançou: imaginemos que dez milhões de chineses vinham para Portugal neste momento. Esses chineses substituiriam os portugueses em todas as suas funções, dado que fazem tudo aquilo que os portugueses podem fazer, mas a metade do preço. Segundo PA, o único benefício que isto traria era os preços todos pela metade, pois dez milhões de portugueses ficariam sem emprego. Por isto, PA diz que a melhor solução para uma crise como a que atravessamos é o proteccionismo.

Com todo o respeito, não poderia estar mais errado. Vamos partir de uma premissa base: todas as pessoas têm necessidades. Vamos a outra premissa simples e que certamente não constitui novidade para o economista Pedro Arroja: as necessidades são o motor da produção - para que as primeiras sejam saciadas, há que produzir o necessário, perdoe-se-me a redundância. Ora, assumindo estas duas premissas como verdadeiras, o que julgo pacífico, chega a altura de referir o óbvio: 20 milhões de pessoas têm mais necessidades que 10 milhões de pessoas. Essas necessidades (pensemos no básico: pão, leite, presunto ou sapatos) rapidamente estimulariam a economia a produzir o que fosse necessário. Aí entrariam os desempregados, que aproveitariam o que o mercado reservara para eles: a produção de pão, leite, presunto e sapatos. Mais cedo ou mais tarde (porque as vantagens comparativas perseguem as pobres e inocentes economias) aquilo em que os portugueses fossem comparativamente mais competentes seria produzido por portugueses e aquilo em que os chineses fossem comparativamente mais competentes seria produzido por chineses.

Para colocar isto num plano super simplificado, até porque nem todos têm de ter noções de Economia, deixo uma pergunta: entre 1950 e 2000 a população portuguesa teve um aumento de, grosso modo, dois milhões de pessoas, temos dois milhões de desempregados? 


02
Fev 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 17:29link do post | comentar | ver comentários (10)

Sou contra o aborto. Isto até me é estranho ao ouvir. É como dizer que sou contra que se mate, roube ou explore. É-me estranho ouvir de tão óbvio que me parece ser. A campanha pela legalização/liberalização da Interrupção Voluntária da Gravidez - quando "aborto" passou a chamar-se "IVG" ficou, subitamente, mais popular - foi um excelente exemplo da pobreza do debate e da manipulação a que algumas forças partidárias submetem a população. É até estranho perguntar-se à população o que é certo e errado. Era como fazermos agora um referendo sobre a legalização do assassínio, absurdo. De qualquer modo, a campanha é água que já passou há muito tempo debaixo desta ponte e, como tal, no passado fica. O que me interessa agora é desmontar muita da argumentação falaciosa que se invocou e trazer novos dados ao debate. Se calhar não vou ter um debate tão estimulante como o da Monarquia, pois há menos gente a ler-me aqui, mas ainda assim, vou escrever e quem quiser que leia. Antes de avançar, vou explicar porque é que acho que é errada a prática do aborto.


26
Jan 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 21:28link do post | comentar

Anne Wortham, professora de sociologia da Illinois State University destrona Obama:

Please know: I am black; I grew up in the segregated South. I did not vote for Barack Obama; I wrote in Ron Paul’s name as my choice for president. Most importantly, I am not race conscious. I do not require a black president to know that I am a person of worth, and that life is worth living. I do not require a black president to love the ideal of America.

I cannot join you in your celebration. I feel no elation. There is no smile on my face. I am not jumping with joy. There are no tears of triumph in my eyes. For such emotions and behavior to come from me, I would have to deny all that I know about the requirements of human flourishing and survival - all that I know about the history of the United States of America, all that I know about American race relations, and all that I know about Barack Obama as a politician. I would have to deny the nature of the “change” that Obama asserts has come to America. Most importantly, I would have to abnegate my certain understanding that you have chosen to sprint down the road to serfdom that we have been on for over a century. I would have to pretend that individual liberty has no value for the success of a human life. I would have to evade your rejection of the slender reed of capitalism on which your success and mine depend. I would have to think it somehow rational that 94 percent of the 12 million blacks in this country voted for a man because he looks like them (that blacks are permitted to play the race card), and that they were joined by self-declared “progressive” whites who voted for him because he doesn’t look like them.

O texto está aqui.

 

(via Ordem Livre)


25
Jan 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 12:03link do post | comentar | ver comentários (1)

 

No Portugal Contemporâneo o Pedro Arroja escreveu um post que também em mim despertou uma pequena reflexão.

A ideia de que o exemplo tem de vir de cima, tantas vezes repetida, é bastante ambígua: tanto pode dar-nos conta de uma sociedade autocrática ou de uma democracia em que o povo tem uma forte consciência moral.

Numa sociedade autocrática o povo esperará que o seu líder lhe diga o que fazer, o que é certo e o que é errado, abdicando da sua capacidade de reflectir acerca da sua conduta moral: o servilismo no seu estado puro, encontrado, por exemplo, na religião.

Por outro lado, numa sociedade democrática, o "exemplo vem de cima" no sentido em que quem está em cima deve ser exemplar, caso contrário, não é merecedor de liderar - a América é um exemplo muito bom disto: se há escândalo, há demissão. Caso quem está em cima não seja exemplar, o povo que o escolheu sente-se defraudado e vê-se no dever de remediar o mal feito, escolhendo alguém melhor.

Felizmente, ainda vejo em Portugal uma sociedade democrática. Acredito que não o seja tanto como outras, mas é realmente bom ver que ainda nos chocamos com casos de corrupção como o que se avizinha: em vez de seguirmos o mau exemplo, ainda nos preocupamos em procurar um exemplo melhor.

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19
Jan 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 21:06link do post | comentar

O Afilhado vai disponibilizar, em directo, o debate "Crise, Globalização e Intervencionismo do Estado". Começa às 21:30. Agora o vídeo ainda tem a "publicidade", mas quando começar o debate, a transmissão muda automaticamente.

 


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