A máfia da blogosfera
04
Set 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 09:58link do post | comentar

A partir do momento em que numa entrevista televisiva um Primeiro-Ministro de um país ataca despudoradamente um telejornal e em que num congresso partidário o Secretário-Geral, curiosamente a mesma pessoa que o Primeiro-Ministro, faz precisamente o mesmo, é inquestionável a responsabilidade moral indirecta, total ou parcial, tanto do governo como do partido em questão na suspensão desse telejornal. E é esta inquestionável responsabilidade que leva a que os partidos comentem algo que, num país decente, estaria completamente fora do seu interesse. Num país decente, claro.

Por muitas justificações que sejam dadas, nenhuma colhe. José Sócrates e o Partido Socialista foram longe de mais. E sabem disso.

03
Set 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 20:24link do post | comentar | ver comentários (24)

Num país decente, a substituição de um programa noticioso por outro e a demissão de uma direcção de informação de uma estação de televisão seria assunto que não interessaria aos partidos políticos a ponto de haver conferências de imprensa de todos, repito: todos. Num país decente.


publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 17:21link do post | comentar | ver comentários (6)

Da próxima vez que, a meio de um discurso de quem quer que seja, os jota-ésse-dês começarem aos gritos, boto uma bomba na S. Caetano à Lapa.


publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 14:41link do post | comentar | ver comentários (1)

Quando José Eduardo Moniz, à data da sua saída da TVI, afirmou publicamente que seria um escândalo o fim do Jornal Nacional de 6ª Feira, julguei sinceramente que ninguém iria ter coragem para o cancelar ou suspender. Enganei-me. Soube-se agora que o «telejornal travestido» que tinha como principal função a «caça ao homem», nas palavras do mui democrático líder do governo de Portugal, foi cancelado e que a direcção de informação se demitiu em bloco. Vivem-se maus tempos para a liberdade.


publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 13:45link do post | comentar

José Sócrates

Na sua primeira intervenção assemelhou-se a um cardeal patriarca: afirmou que a sua preocupação era transmitir confiança ao povo. Sócrates não entende que o que os portugueses precisam não é um líder espiritual, mas sim um líder político. Disse que Portugal foi dos primeiros a sair da crise e que a sua política económica estava a dar resultados. Sobre isto, o João Miranda já escreveu o suficiente.
No que respeita ao apoio às PME, Sócrates manteve o discurso socialista: apoiámos não-sei-quantas e vocês apoiaram menos. Sócrates não entende que um apoio à economia não pode ser feito com base em escolhas de empresas, escolhas essas sempre muito duvidosas, mas sim num aumento da margem de manobra de todas as empresas (simplificação do sistema fiscal, redução de impostos, se possível, etc.).
Mostrou, uma vez mais, que pouco diferente era dos socialistas mais ortodoxos quando se mostrou contra a hipótese de escolha dos cidadãos sobre que tipo de reforma ter: fundos públicos ou fundos privados. Paulo Portas respondeu-lhe na perfeição: «o trabalhador sabe muito melhor o que fazer ao seu dinheiro que o senhor”.
Em relação à segurança, conseguiu manter-se por cima ao acusar o CDS de incoerente entre a actividade parlamentar e a campanha eleitoral.
Infelizmente, pegou de forma muito, muito pouco correcta na questão da guerra. Muito pouco correcta a diversos títulos: por saber que, na altura, pouco mais nos restava, por saber que a participação portuguesa foi quase residual e por saber perfeitamente que durante o seu mandato não fez nada para acabar com o esforço militar e até o aumentou.
Sobre educação, Sócrates mostrou uma vez mais a sua face socialista, na tradição soviética, opondo-se à possibilidade de escolha, por parte das famílias, das escolas a frequentar pelos seus educandos. Conseguiu, sem se rir, falar das Novas Oportunidades como uma vitória – toda a gente soube, desde início, que todo o programa iria servir apenas para «números».
No final do debate, esteve muito bem «esteticamente» ao falar directamente para a câmara. É uma barbie, todos o sabemos. Não conseguiu, no entanto, resistir a, após o debate, dizer aos jornalistas algo que merecia figurar numa antologia de grandes frases da política portuguesa: «confio muito em mim e naquilo que fiz».
 
Paulo Portas
No início do debate voltou a trazer a falsa questão do «aumento da carga fiscal». É falso que o governo tenha aumentado todos os impostos. Se as receitas aumentaram, muito se deve ao necessário combate à evasão.
Sobre desemprego, Paulo Portas conseguiu atirar com perfeição a frase sonante de José Sócrates, que dizia, antes de ser governo, que 6,8% de desemprego era a marca de uma governação falhada.
Em relação à política social, Portas voltou a falar do RSI, um dos tumores de Portugal. Pessoalmente, admiro-o por isto: é o único que tem coragem para denunciar a situação. A hipocrisia e oportunismo de todos os outros faz perpetuas a situação vergonhosa que todos conhecemos. Quando Sócrates acusou a direita de querer privatizar a Seg. Social, Portas fez o favor de lembrar que 25% dos fundos do sistema estão investidos em bolsa. São os caprichos do mercado.
Quando o tema mudou para segurança, Portas pegou muito bem na questão do relatório que o governo decidiu apresentar apenas depois das eleições. Bastante conveniente. Falhou por ter deixado morrer a questão: deveria ter insistido.
No respeitante à educação, Portas também conseguiu sair por cima. Lembrou a frase maravilhosa de Maria de Lurdes Rodrigues («a paz com os professores vai sair muito cara ao país») e rematou com um perfeito, por verdadeiro, «o senhor quis virar um pais inteiro contra os professores».

 

Conclusões

Pareceu-me que, num debate algo nivelado, Paulo Portas conseguiu ganhar. José Sócrates, mais que na sua versão «português suave», esteve na sua versão «carneiro mal morto». Esteve apagado em várias partes do debate e não conseguiu responder em muitas situações. Se Portas é, e é, um político desgastado, Sócrates começa também a sê-lo.


02
Set 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 18:28link do post | comentar

«Section 1. The eighteenth article of amendment to the Constitution of the United States is hereby repealed. [...]

Em 1933, o moralismo abstémio já estava em desuso, o mercado negro proliferava, tinha havido uma crise grave. E faz-se uma emenda para repelir outra emenda, uma curiosidade constitucional. Mas é também uma boa lição: nunca proibir actos privados. Eles voltam sempre.»

 

Pedro Mexia, no recém nascido A Lei Seca

(a propósito da vigésima primeira emenda à Constituição dos EUA)


publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 13:49link do post | comentar | ver comentários (3)
No ido século XIX, Bismarck impôs uma forma de fazer política que mandava os princípios, valores e ideais dar uma curva e que apenas se preocupava com as considerações práticas. Chamou-se-lhe realpolitik.
Nesta viragem de século, a classe política fundou uma nova forma de fazer política. Esta funda-se na realpolitik, por oca e instantânea, sem ideias nem estratégias, mas vai mais longe. Impõe o primado da imagem. É a barbiepolitik.
Provavelmente o maior exemplo de barbiepolitik de sempre foi e é Barack Obama. Se é certo que é um político com ideias, algumas geradoras de bastante polémica, é igualmente certo que o que o fez arrebatar o coração de tantos românticos worldwide foi a criação do culto à sua volta. Obama, antes de ser político, é um boneco. Um boneco daqueles que estampamos em camisolas, canecas e porta-chaves.
Por cá, à nossa escala, temos o obaminha José Sócrates. É alguém sem ideias, que sabe que só pode chegar ao poder através de uma imagem bem trabalhada. A prova disso é escolha da mandatária da juventude do partido – exemplo máximo da via pela barbiepolitik que José Sócrates e o seu PS vão escolhendo. Com tantos jovens com pensamento mais ou menos estruturado, relativamente consistente e com inteligência mais que reconhecida a pairar «à volta», o boneco escolheu uma boneca que ri muito e lê papeis à frente de assembleias de rapazes embevecidos.
E os proles, que são os únicos que nos podem salvar, não esqueçamos, simplesmente deixam-se encantar por tudo isto. Sem querer entrar nos apocalipsismos costumeiros, julgo que 27 de Setembro vai constituir a oportunidade de todos nós para que travemos a barbiepolitik em Portugal e a deixemos na televisão, na secção Internacional dos noticiários. Pessoalmente, num político quero ideias e não o vazio que obriga a que a campanha seja toda feita cortando fitas.

publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 10:41link do post | comentar

António Barreto no passado 10 de Junho fez um discurso sublime. Lindíssimo. Tanto na forma como no conteúdo. Um discurso como há poucos. Mais que isso: um discurso tipicamente português.

É próprio da nossa pátria, este quintal entre o mar e a Europa, olhar para o Estado como o grande educador. É compreensível, se for tomada em conta a secular tradição de centralização da decisão e da intromissão do poder político em quase todos os detalhes do quotidiano. Somos, tristemente, um país que viveu um fugaz ensaio de liberalismo e que nos restantes séculos de história viveu de olhos postos na «nobreza» e na «classe política».
E isto explica a constante exigência de «exemplo» por parte da população em relação aos seus políticos. Aos políticos não é pedida competência. Aos políticos não é pedido respeito pela sua função. O que é pedido aos políticos é «exemplo». É pedido que nos tracem o caminho para que não nos percamos pelas lúgubres vias do pecado. Como se fossemos filhotes a inquirir sobre a melhor conduta aos progenitores. Que fazer, papá – quase perguntamos.
E esta infantilização da sociedade traz para o mundo dos adultos as manhas dos mais pequenos. Roubei? É verdade, mas «eles» também são todos um bando de ladrões! E a autoridade quase fica desarmada com tão cândida defesa. E se crescêssemos um bocadinho, preclaros concidadãos?

01
Set 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 18:42link do post | comentar | ver comentários (1)

Há por aí comentadores de ocasião que louvam, mas à séria, os esforços da diplomacia portuguesa dos últimos anos. Uma boa relação com Eduardo dos Santos aqui. Uma boa relação com Chavez ali. Enfim, um afecto imenso por tudo o que é boa gente.

Apesar de ver em qualquer negócio feito com gente corrupta e criminosa uma forma de legitimação desses crimes – afinal, com o negócio estamos a tirar proveito de algo condenável sob todos os pontos de vista – ainda admito que possa haver uma pacífica relação comercial entre países. Aquilo que não é, a pretexto algum, aceitável é que uma comitiva portuguesa participe nas celebrações da chegada de um ditador ao poder. Nenhum negócio, nenhum benefício comercial, nada justifica que um governo de um país democrático – e a custo – felicite um ditador no quadragésimo aniversário da sua chegada ao poder. Ao participar nas comemorações de Khadafi, Luís Amado cuspiu nos mais básicos princípios pelos quais um político se deve reger.

publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 14:38link do post | comentar | ver comentários (5)

Dizem-me a Daniela Major e o Daniel Santos que o meu blogue é viciante. Prestarão contas pelas mentiras nos respectivos purgatórios. Enquanto isso não acontece, digo eu outros blogues que, para mim, são viciantes. Começo com o Destruição Criativa, só porque sim, e corro logo para o Clube das Repúblicas Mortas. Já com o bicho meio morto, mas com uma fominha ainda considerável, passeio pelo Estado Sentido. Ainda insatisfeito percorro a avenida onde estacionam o Mar Salgado, o Mel com Cicuta, o Hole Horror e o Bomba Inteligente. Salto ainda até ao Pastoral Portuguesa e finalizo com A Origem das Espécies e o Portugal dos Pequeninos, que não sou tipo de comer rasca. E pronto, já disse.


publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 13:17link do post | comentar

Depois de o intragável Moita Flores ter atribuído a medalha de ouro da cidade de Santarém àquele que é, para ele, o melhor dos candidatos a primeiro-ministro – o também intragável José Sócrates – foi a vez dos autarcas de Paços de Ferreira homenagearem o extremoso Pinho com uma avenida com o seu nome. Tudo pelo óptimo trabalho desenvolvido dentro e fora, suponho, do ministério que dirigiu. Obviamente. Que o nosso poder autárquico não cede, ora essa!, às tentações de lamber a botinha para que os amanhãs cantem mais afinados. Que tristeza.


publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 12:57link do post | comentar | ver comentários (2)
Voltei. E neste meu regresso, o sentimento que mais domina o meu ser é o de alívio. Alívio por voltar a dar aos leitores que tanto me gostam – sei que gente muito esclarecida já pensou fazer-me um clube de fãs que rapidamente atingiria uma fasquia maior que o do Senhor Palomar – aquilo de que os privei nas últimas semanas. É, também voltei mais modesto. Aprecio bastante que tenham reparado.
Entretanto, enquanto o meu blogue e o meu twitter entraram em fase de hibernação, muito aconteceu. Não, mentira. Não aconteceu assim tanta coisa: a malta do Simplex queimou as pestanas a ler o programa do PSD, a ver se havia qualquer coisa com que pegar; o Pedro Mexia voltou – aleluia! – com o blogue A Lei Seca; o PPM voltou para o 31 e acho que, de blogues, pouco mais interessa. As silly season’s são pouco propícias a zangas minimamente catitas – finjo que me esqueço do episódio do filho da puta, finjo – e esta não foi excepção.
O programa do meu blogue para os próximos tempos resume-se a três coisas: comentar de forma que eu ache decente o programa do PSD – sem entrar nos gritos de guerra que alguns andam para aí a escrever, o sol é tramado – fazer um relato da festa como a qual não há igual, vulgarmente conhecida como Festa do Avante! – têm de pedir, já agora, para se tirar o ponto de exclamação de «Avante!» – e manter o habitual chorrilho de banalidades que me diverte escrever. Como vêem é um programa ambicioso, com visão alargada e com objectivo de vitória. Diz o preclaro leitor: «ah!, isso todos são!» e eu respondo-lhe com um cândido, carinhoso, singelo: «vai-te lixar».

24
Ago 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 00:29link do post | comentar | ver comentários (4)

O Samuel de Paiva Pires voltou à carga com a questão monárquica. Se é certo – francamente, ó Samuel! – que muito do que escreveu já foi escrito no passado mês de Janeiro e por mim respondido, há que responder de novo, que eu cá não sou de deixar as pessoas a falar sozinhas.

Em primeiro lugar, Samuel, a questão da democraticidade da república em oposição à falta de democracia na monarquia não se prende exactamente com a possibilidade de votar para Chefe de Estado, mas sim com o acesso ao cargo. Isto é, não é o acto de votar que faz da república melhor, é o facto de se poder ser votado. É esta a questão igualitária de que não abdico. E eu não quero ser Presidente da República. Quem quiser que se candidate e acho que o sr. Duarte Pio não tem acesso vedado à candidatura – é só recolher assinaturazinhas.
Quanto à questão da legitimidade, penso que já te respondi no passado de forma razoável, de qualquer modo: o que Weber disse não é necessariamente verdade. Apenas porque Max Weber decidiu criar «tipos» de legitimidade não se segue que esses «tipos» sejam acertados ou os únicos a existir. Nem tão-pouco significa que tenham todos o mesmo grau de importância. De qualquer modo, partamos do pressuposto que, sim senhor, o Max Weber até acertou. A legitimidade carismática não pode ser, de todo, atribuída apenas a reis pelo facto de haver alguns que representam religiões. Isabel II, e todos os seus antecessores desde Henrique VIII, é uma líder religiosa. So what? O D. Carlos não era. O aspecto transcendental só interessa a quem se interessa por ele. Que importa a um ateu ou agnóstico que o possível monarca tenha o toque divino? A legitimidade tradicional/histórica é por ti atribuída ao Rei porque segundo o que dizes «repousa» nele o peso da história. Com o respeito que sabes que nutro por ti, digo-te que acho isto um disparate. Um rei tanto tem o peso da história como eu ou tu. É esta «coisa» demasiado «religiosa», quase dogmática – matéria de fé – que me faz confusão na argumentação monárquica. Isto são «verdades» que não podem ser nem verificadas nem falsificadas. O que é o «peso da história»? O que é o aspecto «transcendental» dos monarcas? São coisas atribuídas aos monarcas simplesmente porque sim. E inegáveis por definição e por isso tão convincentes para quem já está convencido. Quanto à questão legal, ambos os regimes detêm essa legitimidade desde que a lei os preveja – o que me interessa é, precisamente, a razoabilidade da lei que os prevê.
Já o teu argumento de que as monarquias são mais democráticas é o típico post hoc propter hoc. A lógica é a seguinte: aqueles países são mais «democráticos» - aspas porque a avaliação da democraticidade de um país é algo muito relativo – e como são monarquias, então uma coisa é causa da outra. Isto é uma falácia muito comum e que, como tal, tem de ser desmontada. O que eu preciso, Samuel, é que me esclareças sobre a possível relação causal que aqui encontras. Se ma provares, dar-te-ei razão.
Por fim, deixa-me dizer-te que é fraco, fraquinho dizer que uma pessoa não «pode» ser Chefe de Estado no nosso país. O que tu estás realmente a escrever é: «não basta querer para ser» e aí concordo contigo. É óbvio que uma pessoa que se proponha a chefiar um Estado tem de ter a confiança da população e é natural no nosso quadro que sejam personagens já reconhecidas e que venham, claro, dos partidos – porque, infelizmente, a política ainda não se faz fora destes. O que é importante que se diga é que enquanto a um proponente a chefe de Estado é exigida a confiança do povo, a um herdeiro do trono não é. E isto não é admissível.
E não é propriamente uma questão de preferência pela legitimidade em relação à utilidade que está aqui em causa, Samuel. Eu não acho que as suas se excluam mutuamente. Pessoalmente acredito mesmo que ambas se revelam mais satisfatórias num regime republicano que num regime monárquico. Dizes-me que Portugal republicano não é uma grande nação. Eu digo-te que Portugal não é uma grande nação desde o século XVII – e já lá vão quatro séculos, três de monarquia. Alguma coisa há-de haver mais que a «simples» questão do tipo de regime.
 

(volto agora para as férias.)


17
Ago 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 17:59link do post | comentar | ver comentários (2)

Férias. Até depois.


15
Ago 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 19:13link do post | comentar | ver comentários (1)

O almoço tinha sido soberbo. Carne assada na brasa com a bênção das nuvens que, lá de cima, se babavam de fome e inveja e que, para vingança, nos atiravam um calor insuportável, impróprio, mesmo para os mais excepcionais estios. Agora era altura de sair, beber o cafezinho. Então, quase como se todos os presentes fossem máquinas com funções determinadas por um qualquer inventor, foram as mulheres direitinhas à cozinha, carregando pesados pratos de restos e copos vazios – ai não! –, e foram os homens para a porta, fumar os cigarros e falar dos motores dos carros. Mas houve uma mulher que não se levantou ao mesmo tempo que todos os outros. Tinha os olhos semi-cerrados, como se estivesse a aprontar alguma.

– Despacham-se ou não? – ouviu-se lá de fora.
Então a moça de olhar matreiro levantou-se, puxou do bolso um cigarro e um isqueiro e foi, pausadamente, a medo diríamos se não a víssemos tão determinada, em direcção à porta. As mulheres, involuntariamente, deixaram cair a um só tempo os seus queixos – pum! – e levaram as mão gordurosas do frango à boca, escândalo. Nenhuma proferiu palavra, nem sabiam o que dizer. Chegada à rua, fez todos os homens dizer para dentro, ao mesmo tempo, como se estivessem combinados, máquinas programadas:
 – Que diabo!
Não lavou nem um garfo.

 

P.S.: Como os habituais já perceberam, tenho escrito a um ritmo muito menor e tenho «esquecido» a actualidade política. Trata-se, confesso, de puro desleixo e de vontade de desfrutar as férias o mais possível. Lá para Setembro, tudo recomeça.


13
Ago 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 15:38link do post | comentar | ver comentários (2)

O Jorge Assunção escreve, no Novo Rumo, que aproveito para recomendar vivamente, sobre a questão do lobbying. Em traços gerais, e comparando o sistema americano ao português, o Jorge defende a regulamentação do lobbying para evitar que este seja feito «às escondidas».

Penso que para discutir esta questão temos de fazer uma pequena separação de águas. Temos de falar, por um lado, do lobbying quando este acontece na candidatura e, por outro lado, do lobbying quando este acontece no exercício de funções.
No caso do lobbying em relação a candidaturas, defendo a legalização. Porquê? É simples: o povo teria a opção de dizer «eu não quero este tipo» na altura de votar. Se o lobbying fosse transparente nesta fase, só haveria benefício para a democracia: saberíamos com o que estamos a contar. Claro que me escuso a falar dos pormenores, do «como».
No caso do lobbying em relação a titulares de cargos públicos já eleitos ou nomeados é que a porca torce o rabo. A aceitação de dinheiro seja de quem for para fazer um favor por parte de titulares de cargos públicos já eleitos ou nomeados tem um nome: corrupção. Parece-me simplesmente inaceitável. E o argumento de não conseguirmos evitar apesar da proibição não colhe. Levado ao limite permitiria legalizar tudo. Afinal, apesar de ser proibido roubar, continua a haver ladrões.
Esta é uma questão delicada e caso haja um debate sobre isto é importante que não sigamos, como é costume, os exemplos do exterior de forma acrítica.

publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 12:41link do post | comentar | ver comentários (1)

 

«Jerusalém é um grande livro, que pertence à grande literatura ocidental.»

 

José Saramago


11
Ago 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 14:10link do post | comentar | ver comentários (1)

 

Não acontece nada na nossa praia. E se calhar é melhor assim.


10
Ago 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 21:49link do post | comentar | ver comentários (8)

Ao contrário de muitos, em Setembro não me faço de esquisito e vou ao Avante. Não sou comunista, nem tão-pouco social-democrata. Não interessa. Não me pedem que exponha a ideologia que perfilho.

Entro naquelas portagenzinhas do tempo da outra senhora, vagueio pelas bancas inúteis que, nas suas «montras» expõem horrorosos lenços, pulseiras manhosas, brincos que Deus me livre, calças de palhaço e camisolas que nem adjectivo. Ando mais um pouco naquele relvado desfeito e avisto o palco principal, para o qual confluem todas as ruelas daquele oásis socialista que anualmente se cria, para inglês ver. Nas ruelas que confluem, que ver bonito: confluir, encontramos as banquinhas de sempre, vendendo o hambúrguer e a bifana do Porto, de Setúbal, de Vila Real, da Guarda, de Santarém e do resto dos distritos representados – em todos se faz o hambúrguer e a bifana de forma diferente. Se não nos decidirmos entre a especialidade portuguesa, sempre podemos ceder ao imperialismo americano e dar um saltinho ao KFC, para comer uns franguinhos fritos.
Cansados de andar ao sol e a comer que nem alarves, vamos à maravilhosa feira do livro. Temos tudo (aposto que este ano os livros da Isabel Alçada que a Caminho edita vão estar escondidinhos), começando pelas edições Avante – que são geralmente mais baratas na Fnac (é o imperialismo francês) – e continuando por todo um conjunto de editoras que querem estar ali.
Livros comprados, sem factura, que o IVA anda pela hora da morte, saímos para o sol abrasador de novo. Percorremos a confluente rua até ao mais importante dos palcos e vemos uma banda daquelas que gritam muito. Com sorte – como este ano, é por isso que vou – ouvimos gente como a Maria João e o Mário Laginha, a Teresa Salgueiro ou os Clã, os Blind Zero ou o David Fonseca. E, senhores, dá-se a maravilha do evento: do nada começa o retumbar das colunas (que instrumentos é coisa do passado) e ouve-se a Carvalhesa. Como cães aflitos para mijar, os comunas – e aqui, só aqui, se vê quem é comunista e quem é visitante de ocasião – correm desalmados para saltar em conjunto, colectivamente. Arrepia.
Fatigados de tanta andança, saímos do palco principal e vamos até à lagoazinha cuja margem já parece um oásis dos ricassos. A zona verde da Atalaia. Encontramos os cafezinhos, as esplanadas, finda-se o camaradismo e até podemos usar uma casa de banho. Sentados, esperando o nada, vemos o sol pôr-se e, no fim, saímos. Tudo isto na sexta-feira. Sábado e domingo há mais e igual.

publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 13:08link do post | comentar | ver comentários (7)

Escreve-se por aí que a blogosfera está a perder aquilo que lhe dava qualidade em Portugal: o debate ideológico. Li pelo menos duas opiniões sobre o assunto e ambas concordavam entre si com a putativa mudança do discurso blogosférico: passou de pensamento político sério e mera campanha partidária – a de Bruno Sena Martins (no 5 dias) e de Pedro Mexia (na Visão).

Se é certo que começam a aparecer blogues que não são mais que comícios online de fraca qualidade, não se pode dizer que a blogosfera esteja a perder a outra parte: da discussão séria de ideias. Basta que se dê um saltinho ao blogómetro e rapidamente observamos que no topo da lista ainda estão os blogues que fizeram da blogosfera aquilo que é: os de comentário de actualidade – normalmente assinados por jornalistas – e os de discussão ideológica.
Felizmente, e digo isto enquanto autor de um dos blogues de campanha, os blogues partidários são blogues de ocasião na maioria das vezes. Todos sabemos que blogues como o Jamais ou o Simplex, o Super Mário ou o Pulo do Lobo, são blogues com o objectivo definido, uma tarefa concreta e que, depois de cumprido ou não o objectivo se esfumam completamente.
Seria péssimo, sim, que os blogues ganhassem os vícios que a opinião publicada tem na maioria das vezes, principalmente nos programas de televisão (a propósito, nos programas de televisão é mais que notória a diferença no tipo de discurso de quem vem de blogues e de quem vem do sistema). No entanto, não acho que isto já tenha acontecido. Espere-se pelo fim de Outubro, quando a ressaca passar, e tudo voltará a ser como era.

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