A máfia da blogosfera
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Jul 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 10:41link do post | comentar

Desafia-me o Stran a ir aos baús velhos da discussão do aborto para lhe dizer por que o acho imoral.

Em primeiro lugar há que desfazer uns quantos nós: a decisão de engravidar ou não é do indivíduo sem dúvida nenhuma – e por isso não me oponho à contracepção como alguns fazem. A questão aqui é outra e prende-se com o depois, com aquilo que é correcto dado que já existe gravidez. É que muitos, ao discutir o aborto, colocam no mesmo saco estas duas coisas: engravidar ou não, interromper a gravidez ou não. Sobre a primeira a sociedade não tem nada a dizer. Sobre a segunda, o caso muda de figura.
Quando se fala em gravidez está a falar-se de uma situação em que, a menos que haja uma acção positiva em contrário, haverá uma nova vida. Esta acção positiva é o aborto voluntário. Será aceitável que uma pessoa, e aqui coloco de parte as teorias sobre o início da vida que inquinam o debate sempre, possa travar um desenvolvimento que dará numa vida? Qual é a diferença substancial entre matar e impedir que se viva?
Uma vida não é obviamente uma obrigação. A lei anterior não dizia: todos os casais têm de ter filhos. O que a lei anterior dizia era: se os casais engravidarem não podem interromper a gravidez. Parece-me quase absurdo discutir isto, mas estamos a discutir sobre a moralidade de pais e mães gerarem filhos e, depois, seja por que motivo for, interromper o processo acabando por, na prática, matá-los.
Respondendo directamente à pergunta, Stran, o facto de eu ser liberal não implica que eu idealize um Estado de Natureza em que matar-te é uma acção de moralidade nula. Eu sou liberal, mas não vou atrás das restantes marias dizendo que é tudo uma questão de escolha. É uma questão de escolha individual, sim, mas tem de se compreender que essa escolha não tem efeitos apenas no indivíduo, mas sim num outro ser. E, Stran, um projecto é quando temos dezassete anos e sonhamos em ter sete filhos. Um feto não é um projecto.
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Oi Tiago,

Desculpa o meu atraso no comentário. Infelizmente não tive tempo anteriormente.

Vamos por partes:

Fiquei contente com duas coisas que estamos de acordo (embora acabemos por tirar ilações diferentes):

1 - "a decisão de engravidar ou não é do indivíduo sem dúvida nenhuma"

No entanto, e neste caso, para existir uma decisão, tem (ou têm) os intervenientes de fazer parte dessa decisão. Isto é, enquanto a gravidez for um "acto de deus", ou seja algo que acontece e não algo que nós conscientemente decidimos então não podes falar em "decisão".

Mas isto aponta para outro tema que eu julgo que é fundamental e basilar nesta discussão (no entanto essa é a parte que deixo para o meu próximo artigo no meu blogue, eu depois deixo-te o link).

2 - "Uma vida não é obviamente uma obrigação"

Ora o contrário de obrigação é a opção. A verdade é que sem IVG (e se calhar num futuro não estaremos a falar de IVG mas de uma alternativa menos contorversa) não podes falar em opção.

"A lei anterior não dizia: todos os casais têm de ter filhos"

Apenas dizia que todos os casais são forçados a ter filhos contra a sua vontade caso algum acidente ou descuido aconteça.

No entanto gostava de apontar uma contradição no teu texto:

Dizes a determinada altura:

" e aqui coloco de parte as teorias sobre o início da vida que inquinam o debate sempre"

Para depois concluires que:

"não implica que eu idealize um Estado de Natureza em que matar-te é uma acção de moralidade nula"

Ora só podes falar matar quando já tens noção de vida (porque senão não podes falar em matar) e se tens uma noção de vida, então já tens uma noção do seu inicio, que por causa da tua primeira afirmação não abres sequer possibilidade de discussão.

Outro ponto que julgo que é dificil de sustentar é quando defendes:

"Será aceitável que uma pessoa (...) possa travar um desenvolvimento que dará numa vida?"

Ora quando defines aborto como "acção positiva", abres o campo para a doutrina cristã sobre esta temática. É que qualquer medida contraceptiva é uma acção positiva que pode travar um desenvolvimento que dará numa vida!
Stran a 21 de Julho de 2009 às 13:04

1. Não percebi aquela coisa do acto de deus. Penso que o que escrevi era claro: engravidar ou não é uma opção dos intervenientes.

2. Estás a misturar. Tens a opção de engravidar ou não. Quando a gravidez já é um facto, então partes para uma nova discussão.

3. A lei anterior dizia, precisamente, que se um casal engravidar, então tem de arcar com as consequências.

4. Não percebeste o que quis dizer. O que eu quis dizer foi que a liberdade não é infinita. Por eu ser liberal, não idealizo uma situação em que possa fazer o que quiser sem olhar às consequências.

5. Não, não é a doutrina cristã - aliás, tendo a fugir a essa. Na contracepção tu não estás a travar nada. Tens células TUAS às quais podes fazer o que te apetecer. Tal como podes fazer o que quiseres ao TEU cabelo, à TUA saliva, o que for. Usar um preservativo é o mesmo que masturbares-te. No caso do aborto, tu já tens algo que, para além de não se poder considerar propriedade tua, pelo menos é alheio ao teu corpo, apesar de dependente (e não estou a colocar em questão uma vida ou não) e que, a menos que faças algo em contrário, irá ser um humano como eu e tu.

1 - Um acto de deus é quando acontece algo fora do teu controlo (act of god), que no fundo é o que acontecia nesta situação. Por mais que quisesses não podes prevenir uma gravidez de acontecer, é um acto mecanico do nosso corpo! E como não existem metodos infaliveis por enquanto gravidez continua a ser um act of god. Quando inventarem um botão "on-off" para esta situação então não vejo nenhum problema em não existir a IVG. Neste momento esse é o unico botão "on-off" que a sociedade humana encontrou...

2 - Não tens essa opção.

3 - Ou seja uma obrigação!

4 - Eu também. A questão é que não tens nenhum fundamento legitimo para limitares essa liberdade.

5 - "..., para além de não se poder considerar propriedade tua, pelo menos é alheio ao teu corpo..."

Porquê?

Stran a 21 de Julho de 2009 às 14:29

1 e 2. Ai tens a opção tens. Eu sei que isto vai parecer estranho, mas tenta ter mente aberta: tens vários estádios. O primeiro é ter sexo ou não. Quando tens sexo estás a obter prazer, mas a assumir riscos, entre os quais engravidar ou contrair doenças. Ter sexo é, portanto, uma opção que já sabes no que pode dar e que podes ou não fazer. (não estou a defender a abstinência!). O outro estádio é o da contracepção: queres fazer sexo e então tentas minorar ao máximo os riscos. Claro que nunca há risco nulo, como em tudo na vida. Mas que tens a opção de engravidar ou não, lá isso tens...

3. Precisamente. Do mesmo modo que é uma obrigação alimentar uma criança recém-nascida ou educar um pré-adolescente para escrever e ler. A sociedade também é feita de obrigações.

4. É esse fundamento que estamos a discutir.

5. É alheio ao teu corpo pura e simplesmente. Tanto é, que o tiras. Uma gravidez é algo estranho ao normal funcionamento do organismo. Não nos vamos meter com filosofias sobre se o feto é um órgão do corpo da grávida ou não. Porque não é.

Oi Tiago,

Antes demais quero dizer que já escrevi aquele artigo (o ultimo sobre este tema no meu blogue pois prefiro depois continuar a discussão aqui):

http://blogdotuga.blogspot.com/2009/07/sexo.html

Interessante que estamos em sintonia pois é sobre o sexo!

1&2 Pois a unica opção que dás é não fazer. E isso é uma opção moral! Estás a impor a tua moralidade sobre a dos outros.

4 - Consegues precisar o fundamento?

5 - Para mim a gravidez é natural ao funcionamento do organismo, aliás esse é que é o problema. Raios neste ponto não achas que estás a ser demasiado restritivo. Como é que queres que haja discussão se és tu que estás a determinar o que é ou não é? Se és tu que defines todos os conceitos é obvio que não há discussão. O "é assim porque é assim" para mim não é argumento.
Stran a 21 de Julho de 2009 às 15:21

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