O nosso Portugal dos pequeninos, e isto tem dono, irá durante os próximos meses falar de duas coisas apenas: gripe e eleições. Temas bonitos, interessantes, em que geralmente se fala sem saber. Mas há uma outra coisa sobre a qual os portugueses, bem como os restantes europeus, deveriam falar: o segundo referendo irlandês.
E a discussão sobre o segundo referendo irlandês deveria ser apenas o pontapé de saída para uma discussão muito mais alargada sobre a própria UE que hoje temos. Pessoalmente, penso que é muito perigoso o caminho que estamos a percorrer.
Enquanto em todas as nações se procura descentralizar o poder e, mais que isso, impor contrapesos e freios aos que o detêm, a Europa é um oásis de totalitarismo disfarçado. Os órgãos europeus com um poder desmesurado – a legislação portuguesa é em 80% emanada do Parlamento Europeu – não têm limites e quando um povo, um único povo que seja, se opõe às decisões centrais, acaba derrotado pelo desgaste, fazendo-se referendos atrás de referendos até que a decisão vá adiante. Principalmente uma decisão como o Tratado de Lisboa que, entre outras coisas, proíbe o referendo a tratados futuros. Que paradoxo tamanho este de com um Tratado ratificado por democracias ocidentais se dar um salto para trás em matéria de deliberação popular.
A União Europeia há muito que ultrapassou os limites. Está a tornar-se aos poucos, e sem que seja dada ao povo a possibilidade de se pronunciar, um mega-estado. E pior que estar a tornar-se um mega-estado, está a ser toda construída com base numa espécie de pensamento único, uma consensualização imposta, uma terra de sins (e aqui podem ler o plural de sim ou ver outro significado qualquer). É preciso muito rapidamente travar o processo de crescimento da máquina europeia e repensar tudo isto. A bem de um continente mais livre e democrático que não se submeta acriticamente às decisões dos eleitos.