A máfia da blogosfera
20
Jun 09
publicado por Tiago Moreira Ramalho, às 15:14link do post | comentar

O vazio ideológico que domina tanto a direita como a esquerda em Portugal, e claro que em ambos os termos coloco umas gigantescas aspas por não considerar que haja verdadeiramente disso no nosso país, leva a que, neste momento, já não se discutam ideias, mas pessoas. O que se discute nestas eleições não é a social-democracia socrática ou a social-democracia ferreira-leitista que, tirando algumas questões quase fracturantes, propositadamente fracturantes porque resta muito pouco para discutir, são iguais. O que se discute verdadeiramente são as personalidades dos líderes. A mudividência de José Sócrates, a idade de Ferreira Leite, a arrogância do primeiro, a fraca capacidade de comunicação da segunda. Tudo questões que não deveriam importar a absolutamente ninguém quando vota. Quando se votar em Outubro, não vão aparecer as larocas carinhas de cada um, mas sim o símbolo dos partidos que deveriam ter por detrás ideias, ideologia. Falta isso em Portugal. E essa falta de ideologia tanto de um lado como do outro, a febre da realpolitik, leva a que o João Távora defenda que a direita se deve unir, leva a que o André Abrantes Amaral defenda que a direita se deve unir, leva a que, em Lisboa, comunistas, bloquistas e socialistas se juntem contra o demoníaco monstro da AD alfacinha. Leva a que todos se perguntem pelos motivos de José Sócrates não pertencer ao partido Social Democrata ou pelos motivos de o CDS não se fundir no PSD. Este vazio, que conduz, claro está, ao oportunismo e incoerência apenas fortalece as forças radicais que, pelo menos, têm marcas ideológicas muito bem definidas e não mudam de ideias a cada semana que passa. Chega de votar no A ou no B. É preciso começar a votar-se em ideias e para isso é preciso que haja ideias. Por isto, aquilo que se deve pedir aos partidos, já que entrar no meio é uma missão quase impossível, não é que façam melhores fintas aos jornalistas para que ganhem com margem reduzida daqui a três meses. O que é preciso pedir aos partidos são cartas de princípios, manifestos, ideais. Coisas palpáveis, coisas que se possam discutir. Isto para que toda o comentário político nacional não seja em torno dos cabelos brancos que Sócrates vai ganhando ou da quantidade de netos que Manuela Ferreira Leite já tem.


Brilhante!
Sem ironias. Do melhor que tenho lido a este respeito.
Vou recomendar nas minhas leituras da semana, não que precises mas porque está mesmo bom.
Carlos
Carlos Santos a 20 de Junho de 2009 às 19:33

Acrescentaria apenas que a mesma exigência deve ser feita aos jornalistas e comentadores: que não se concentram tanto no processo, na "metapolítica" do tom, do estilo, do momento, e mais nas ideias.
Nos dias que correm, um "bom" politico é medido mais pela sua capacidade de sobrevivência e promoção no aparelho partidário do que por alguma coisa que tenha dito ou feito pelo país.
l.rodrigues a 21 de Junho de 2009 às 09:11

Os jornalistas e comentadores fazem o que quiserem, nós ouvimos ou não...

E desesperamos porque essas ideias não passam da promessa, mesmo quando pensamos " agora vai ser mesmo! "
Cristina Ribeiro a 21 de Junho de 2009 às 21:11

Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. E nao será óbvio que um político deverá ter um carácter que garanta aos eleitores o cumprimento do tal programa?
Osorio a 21 de Junho de 2009 às 23:53

Tudo isto deriva de uma tremenda falha da tua república: o espírito cívico que foi sendo construído ao longo de todo o século XIX e que subitamente teve uma síncope durante mais de 6 décadas de ausência de um normal parlamentarismo que aliás, estava em rápida evolução há cem anos.
Os partidos de hoje são criações verticais, sem verdadeiras raízes históricas que ditassem essa necessária correspondência com interesses diversos e uma base social perfeitamente correspondente aos anseios dos seus membros e potenciais eleitores. O exemplo oposto e o Reino Unido.
Nuno Castelo-Branco a 22 de Junho de 2009 às 11:28

Lá tinha de vir a «minha» república. Deixe a senhora de seio ao léu descansadinha que isto é outra coisa.
Vai-me dizer que na república americana não há espírito cívico?

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