O dia de ontem e o de hoje, conjugados, são metáfora mais que perfeita para descrever o que somos. Um país que vive no limbo entre a memória do passado e o fervor da fé. Os dois dias são feriados e se o primeiro ainda pode ser aceitável, por ser da nação, e mesmo assim muito discutível, o segundo, o de hoje, é absurdo. Não a celebração, que de crenças e fés, cada um sabe de si. O que é absurdo é o feriado no dia de hoje. Institui-se que toda a nação festeja, mais passiva ou activamente, pouco importa, uma celebração religiosa. Só por si não é errado. É, no entanto, profundamente injusto para as outras religiões. Um indivíduo com uma outra religião, usufruindo destes feriados que não lhe dizem coisa alguma, tem de tirar do seu bolso para poder festejar os seus. Temos, perante a lei, uma desigualdade com base na religião, isto num Estado que se diz laico há trinta anos. Um católico tem os seus dias de celebração garantidos, muitos, poucos, não interessa, tem-nos garantidos, sem que tenha de tirar do seu bolso. Um não-católico que queira celebrar os seus feriados tem de perder um dia de férias ou, simplesmente, perder um dia de salário. É uma desigualdade que não salta à vista, principalmente porque há muito poucos a queixarem-se e os que há são geralmente desprezados. Que parvoíce. Seria, no entanto, muito interessante que houvesse um sério debate sobre esta questão. Sobre se perpetuaremos esta situação ou se faremos algo para a mudar.
Na imagem: Jews Praying in the Synagogue on Yom Kippur, de Maurycy Gottlieb (1878)