Isto da retórica tem muito que se lhe diga. E o Tomás Vasques mostra-se um mestre na arte. Para o Tomás, do facto de haver taxistas, empregados de hotel, médicos e enfermeiros a trabalhar no dia de Natal ilucida, sem sombra para dúvidas, os fundamentos da luta dos professores. Ao que parece, ao ver gente a trabalhar na santa quadra, o Tomás apercebeu-se que o que os professores querem é manter ordenados acima da média (primeiro, qual é a média? depois, sabe quanto é que um professor em início de carreira ganha?), sair cedo (do quê?) e progredir na carreira conforme os anos de trabalho (coisa nunca antes vista na Função Pública). Enfim, o que os professores querem é manter as regalias às quais se habituaram.
Eu, calhando, até concordo com o Tomás em certa medida. Também acho que os professores devem ter uma progressão baseada no mérito. O problema, Tomás, é que não é isso que se fará caso esta avaliação vá em frente. Eu passo a explicar. Primeiro, os professores avaliadores são os professores titulares, certamente já ouviu falar, que o são por todas as razões menos por ensinar bem: direcções de turma, assentos nas assembleias de escola e conselhos pedagógicos, chefias de departamento, tudo isto contadinho serviu para distinguir os professores de primeira dos de segunda. Agora, os professores de primeira avaliarão os de segunda, sabendo nós que não é líquido que sejam melhores professores que os avaliandos. Há ainda a questão de um professor de uma área científica avaliar outro de outra área científica - o Tomás gostaria de ser avaliado por um trapezista no seu emprego? Depois há os parâmetros de avaliação em si que são tudo menos objectivos. Para pegar no exemplo das notas dos alunos. É óbvio que um bom professor tem alunos com sucesso, mas como é que se compara esse sucesso de professor para professor? Repare que os critérios de avaliação dos alunos são diferentes de escola para escola e, muitas vezes, de professor para professor, e a inexistência de exames nacionais a todas as disciplinas e a todos os anos impossibilita a existência de uma bitola segura, que não seja a "média nacional". Só para acrescentar, acha que o professor de uma localidade com muitos problemas sociais vai ter uma tarefa semelhante à de um professor situado num lugar sem problemas de maior?
Agora, quanto ao ordenado e ao "sair cedo" (que suponho querer dizer sair cedo do local de trabalho), não posso concordar. Um professor, ou seja, um indíviduo com curso superior, começa a carreira sem atingir os mil euros. Isto quase não se vê noutra profissões. Quando um engenheiro inicia a carreira, a ordem impõe o ordenado, por exemplo. Por outro lado, acho que os ordenados astronómicos a que um professor "antigo" chega são absurdos, até pelo facto de terem redução de horário. A redução de horário é outra coisa que contesto, é a única "classe" (se se lhes pode chamar classe) em que isto acontece. Quanto ao "sair cedo", só quem não conhece é que o pode afirmar. É certo que o horário lectivo semanal é de 22 horas, mas as aulas de substituição, as reuniões, os testes e a preparação das aulas, tudo junto, é tudo menos "sair cedo".
Para além disso, caro Tomás, é sempre possível marcarmos a nossa posição sem tratar com o desprezo com que tratou todo um grupo profissional constituído por cento e cinquenta mil pessoas. Mas, pronto, isto da liberdade de expressão às vezes não é muito bem compreendido.