Sobre a entrevista que o líder dos comunistas portugueses deu a Judite de Sousa deixo umas notas, armando-me, claramente, em Alexandre Homem de Cristo.
(1) Jerónimo de Sousa, claro, apresentou-se contra a alteração ao Código do Trabalho. Não é o conteúdo da contestação que quero comentar. É o facto de, para o fazer, se ter revestido na Constituição e não em nenhum princípio ou argumento lógico que o justifique. Mostra apenas que a Constituição portuguesa é uma arma política ao serviço do seu principal responsável: o PCP.
(2) A cartilha sobre as privatizações é igual à do passado. O PCP tenta mostrar-se mais actual, mais alerta para as mudanças e para as evidências que a História nos trouxe com um desagradável paladar a sangue humano, ao defender a nacionalização dos «sectores estratégicos»; no entanto, Jerónimo reforça que é contra qualquer tipo de privatização e não viabilizará um Orçamento que as preveja.
(3) Sobre o apoio de José Saramago a António Costa, Jerónimo de Sousa fugiu à questão da deslealdade, falando na força do colectivo e da vontade de manter a decisão, apesar das declarações públicas do Nobel. Diz que não haverá lugar para processo disciplinar, mas não se adianta: diz que «são coisas nossas».
(4) Ao longo de toda a entrevista foram várias as referências à força do partido, do colectivo. Nisso, Jerónimo tem razão. O PCP é provavelmente o partido mais coeso em Portugal, muito devido a comportamentos pouco recomendáveis, mas é uma realidade. E, é verdade, a festa do Avante é a prova disso.
(5) É também curiosa a questão da entrega do salário de deputado ao Partido, por parte da própria classe dirigente. É quase do domínio da esquizofrenia o facto de, por um lado, defenderem de forma cega que, dê por onde der, todos os pobres têm de ter mais e, ao mesmo tempo, rejeitarem eles próprios a possibilidade de ter uma melhor vida de uma forma honesta e perfeitamente legítima. Cada um faz o que quer com o seu salário, mas é perturbador como a classe dirigente do PCP consegue, ao mesmo tempo, pedir mais para os mais pobres, e sentir que estão a ter um comportamento mais íntegro ao manterem-se pobres; como se o dinheiro, sujo, lhes destruísse a alma.